A Promissória
(Adaptação de Paul Perret)
No Leblon-Palace, o "cabaret" da moda, João Polydoro, — o pintor a quem a fortuna ainda não havia sorrido, mas que ganhava largamente com os seus pequenos quadros galantes, — não cessava de fazer a corte à famosa mundana Etelvina Bournet.
Etelvina era uma rapariga de amor, a quem vinte anos de exercício contínuo da profissão tinham dado o tato exato do negócio. Por isso, quando João Polydoro lhe falou em passarem juntos uma tarde, estipulou, logo:
— Quinhentos mil réis!
— Quinhentos mil réis!... Seria com prazer, — replicou o rapaz. — Falta-me, porém, no momento, uma cousa: o dinheiro... Eu terei crédito?
— Eu simpatizo com você, filho, — concordou a rapariga. — Você assina uma promissória, e está tudo arranjado.
João tirou do bolso uma caneta, e, sobre a mesa em que conversavam, escreveu:
"A 30 de novembro de 1923 pagarei à vista desta a mle. Etelvina Bournet a quantia de quinhentos mil réis, valor recebido em mercadorias".
Selou, datou, assinou, entregando o documento à Etelvina.
— Mercadorias?... — estranhou a rapariga.
— Queres que, em vez de "em mercadorias", eu escreva "em espécie"? A palavra não tem importância. Pensemos na hora presente, e amemo-nos!
Amaram, amaram e, a 30 de novembro, às 11 horas precisas, Etelvina Bournet batia à porta do quarto do Rio-Hotel em que João Polydoro habitava por esse tempo.
— Bom dia; eu venho receber a promissória... — disse.
O artista tomou o papel, examinou-o, e, fazendo uma cara de contrariedade:
— É minha a letra, é. Eu reconheço a dívida, mas não pago. Só com audiência da companhia de Seguros.
E fechando a porta:
— As mercadorias estavam avariadas...