A despedida (Humberto de Campos)
— E quando é que receberás o meu beijo, nessa boca de rosa? — indagou, comovido, Frederico Duval, os braços apoiados no balcão da casa de modas, olhando, nos olhos, aquela encantadora "vendeuse" de pupilas da ouro, que era a sua maior preocupação dos últimos tempos.
A moça baixava os olhos, distraída, as mãos nervosas e claras alisando o vestido de um manequim, e confessava, com tristeza:
— Não pense nessa coisas, Fred. No dia em que se desse isso, nunca mais nós nos veríamos! Eu teria vergonha de você, e nunca mais lhe apareceria!
A sinceridade com que Onezinda lhe dizia isso, fazia com que o rapaz, tão audacioso em outras circunstâncias, não insistisse no pedido. Respeitava aquela pureza, a ingenuidade daquele sentimento, a melancolia daqueles olhos.
Há no amor puro, porém, um momento, em que os anjos se retiram para entregar os noivos ao diabo. E foi isso, exatamente, que sucedeu certa manhã, quando, por insistência do Frederico, a rapariga lhe foi bater à porta do quarto, na pensão, com a condição, embora, de, depois, nunca mais se verem na vida.
Ao meio do dia separaram-se. Nunca mais, pela ameaça da moça, se deviam ver. Aquele beijo de paixão tinha de isolar, para sempre, duas criaturas, dois destinos, duas vidas. E era por isso que, ao abrir a porta para deixar Onezinda no corredor. Frederico Duval tinha os olhos velados pela tristeza mais funda.
— Adeus, Onezinda! — disse, quase chorando. — Adeus... para sempre!
— Adeus, Fred! — gemeu a moça, os olhos no bico do sapato.
E, num assomo de coragem, de decisão, de energia, ganhando a porta:
— Até... de tarde, Fred... Sim?...