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Baile da Lavadeira

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Sai a 1ª lavadeira (cantando)

Antes que o sol saia,
Hei de madrugar
Nas margens do rio,
Onde vou lavar.

Passarei contente,
Muito divertida.
Com as mais companheiras
Da mesma lida.

Aqui ficarei
Bem acomodada,
Livre do calor,
E da enxurrada.

Neste cantinho
Ficarei contente,
Dando lugar
Se vier mais gente.

Sai a 2ª 1avadeira (cantando)

Eu vou caminhando,
Que o sol está alto,
Eu não sei se corro,
Eu não sei se salto.

Porém já lá vejo
Outra companheira.
É Damiana
Que veio primeira.


Fala a 2ª lavadeira para a 1ª

Deus vos salve, maninha,
Aqui sejais bem chegada,
De perigos e de sustos
De tudo sejais guardada.

Fala a 1ª. Pastora

Deus vos salve, e também vós,
De que chegais tão cansada?
Por vires hoje mais tarde
É que estais tão fatigada?

Fala a 2ª Pastora

Na verdade, Damiana,
Que muito tarde acordei,
E como vim na carreira,
Muito cansada cheguei.

Fala a 1ª Pastora

De que pois então corrias?
Viste acaso alguma fera,
Ou algum lobo faminto,
Ou viste tremer a terra?


Fala a 2ª Pastora

Tenho andado sozinha,
Por bosques, penhas e vales:
Entre animais ferozes,
Mas sempre livre de males.

E assim, oh Damiana,
Dou graças ao Criador,
Pela mercê que me fez
De me dar tanto valor.

(Cantam as duas Lavadeiras, seguindo para uma horta a estenderem roupa.)

Pastorinhas, grande dita
Hoje todo o mundo alcança,
Baixou já dos Céus à terra,
Fruto da nossa esperança.

Canta Benta, passeando na horta.

Grande pensão, grande lida.
Eu tenho na horta bela,
De rega-la, de cuida-Ia,
Que não dê o bicho nela.

(Volta)

Quem quer comprar
Verduras mimosas,
Enquanto estão
Mui cubiçosas?

Benta para as lavadeiras:

Grande confiança é a vossa,
De estenderem roupa nesta horta.

Ganta Benta
Quem quer comprar, etc.

Sai a 4ª pastora, cantando:

Ando procurando
Se alguém me viu
O meu carneirinho,
Que me fugiu.

Por mais que eu procure
Por todo caminho,
Não posso encontrar
O meu carneirinho.

Do meu curralinho
Stulto fugiu,
Não sei como o lobo
O não enguliu.

(Entra na horta de Benta, apanha o carneiro e canta)

Lá está na horta
De Benta hortaleira;
Como está cansado
Da grande carreira!

Benta para a 4ª Pastora

Pastorinha, como entraste
Aqui, sem minha licença ?
Olha que esta ousadia
Já me causa grande ofensa.


4ª Pastora

Ouve-me falar primeiro.

Benta

Desculpas não tens que dar,
Ide-vos deste lugar.

4ª Pastora

Senta, cá comigo,
Fale com modo atento,
Pois eu não hei de sofrer
De qualquer, atrevimento.

Benta

Atrevimento. Filena!
Ignoro este tratar;
Não queiras pois deste modo
A minha fúria irritar.

4ª Pastora

Ora dai-me o carneirinho,
Não é vosso, pois é meu.

Benta

Também tenho parte nele
Pelas ervas que comeu.

4ª Pastora

Como isto pode ser,
Agora me rio eu. . .

Benta

Ora isto não se atura,
Eu estalo de paixão.


4ª Pastora

Assim é, bela menina,
Pelo que diz tem razão;
Ora dai-me o carneirinho,
E basta de mangação.

Benta

Levai, pois,
O carneirinho,
Já dele me não importa;
Só quero saber por onde
Vós entrastes nesta horta.

4.a Pastora

Na carreira em que ele vinha
Saltando montes e vales,
Perdi de todo a razão
Precipitei-me nos males

Saltei logo a vossa cerca,
Sem mais pequena detença,
Por não perde-lo de vista
Não vos fui pedir licença.

Canta Benta

Levai O carneiro,
Já creio ser vosso:
Ficar-me com de
Conheço não posso.

Canta a 4ª Pastora, retirando-se

Ficai-vos embora,
Pastorinha bela,
As ninfas vos teçam
Mimosa capela.

Sai o Pescador com o carneiro, fala.

Venha cá, meu carneiro.
Venha para cá, meu amigo,
Que me há de servir de forro
Cá dentro do meu umbigo.

Não há de chegar à porta,
Nem tão pouco .à janela;
Só há de andar no fogão
Metido em uma panela.

O peixe é para a noite,
Você só para o jantar;
Como é hóspede não quero
Que tenha o pior lugar.

Há de ter vinho na mesa,
Não cuide que há de ser só,
 Porque pode, por descuido,
Me dar na garganta um nó.

Chupei o belo quitute
Que lá na fontinha achei;
Indo para cima um pouco,
Com este carneiro encontrei.

Se acaso houver dono dele,
Há de entrar comigo em contas;
Entrega-lo não hei de
Por meio de várias pontas.

Sai a 4ª Pastora e fala

Venha cá, camaradinha,
Onde este carneiro achou?

Pescador

Por ventura ele é seu?
Meu trabalho me custou.

4ª Pastora

Dona sou bem verdadeira,
A razão eu lhe direi;
Pois do curral me fugiu,
Cousa que ele nunca fez;
Mas só lhe digo, que esta
Já é a segunda vez.

Pescador

Você, se quer o carneiro,
Há de me dar os sinais,
Antes que o leve primeiro.

4ª Pastora

Ele é todo branquinho
Só com uma malha em roda;
Tem uma estrela na testa
Que mal se vê, por sutileza,
Que parece ser pintada,
E não ser da natureza.

Pescador

Você cuida que eu estou doudo?
Estou com todo o meu sentido,
Dê-me o sinal que quiser,
Com tudo isto, eu duvido.

4ª Pastora

Você, como o carneiro
Não quer soltar das unhas,
Eu irei chamar a Benta
Que é boa testemunha.

Pescador

Na verdade razão acho,
 Para que dar testemunhas ?
Não grite, falemos baixo.

(Dá o carneiro)

Quanto mais corre a notícia,
Que na Lapa de Belém
Nasceu, por nossa ventura,
Jesus, todo nosso bem.

Vou agora até o rio
O meu cofinho buscar;
Antes que algum curioso
Vá os meus peixes furtar.

(Vai-se)

1ª Lavadeira 1para a 2ª

Vamos também para a fonte
Nossa roupinha enxugar,
Para também do trabalho
Um pouquinho descansar.

O Pescador para as Lavadeiras

Eu também vou até o rio
O meu cofinho buscar,
Pra da minha pescaria
Algum peixinho ofertar.

(Vai-se)

Saem as Lavadeiras, cantando.

O cofo do peixe
Que nós achemos
Na beira do rio
Também levemos.

Já que a fortuna
Nos entregou,
O dono esquecido
O não levou.

Sai o Pescador, cantando.

Grande peça me fizeram,
Grande logro me pregaram;
Toda a minha pescaria,
Todo o meu peixe levaram.

As duas Lavadeiras

Vamos às nossas cabanas
Nossos .peixinhos tratar,
Que quem chupou o quitute
Sem peixe venha a ficar.

Ainda que venha o dono
Há de levar por um óculo'.

Chega-se o Pescador às Lavadeiras e diz:

Eu me vou chegando a elas
Antes que venha mais gente;
Hei de tomar o meu cofo
À fôrça de unhas e dentes.

Senhoras, dê-me o meu cofo
Que a mim é que pertence;
Sou obrigado a levá-lo,
Disto me não dispense.

Senhoras, dê-me o meu cofo
Não quero graças agora,
Pois eu estou de jornada
E me quero ir embora.

(Começa ele a puxá-las.)

As Lavadeiras

Você é que quer o cofo?
Há de levar uma bota;
Não puxe assim pela outra,
Vá puxar sua avó-torta.

(Sai a 4ª Pastora, toma o cofo das mãos das Lavadeiras, entrega ao Pescador e diz:)

Pois que é isto, meu pastor,
Que contenda é esta agora;
Sabe isto como se faz?
Tome já, vamos embora.

As duas Lavadeiras para a 4ª Pastora

T'odavia, pastorinha,
Olhe como é chibante,
Entregue o que nos tomou
Aqui já no mesmo instante.

O Pescador para as duas Lavadeiras

O que foi que eu lhe furtei?
Um caboré de guisado!
Eu furtei porque estava
Já de fome arrenegado.

Fala a 4a Pastora para o Pescador

Foi muito bem acertada
Esta peça que vos fez;
E' para vós não cairdes
Noutro logro outra vez.

Pescador

E de mais, belas meninas,
Não sabem que sucedeu?
Que hoje por nossa ventura
Jesus em Belém nasceu?

Todas

Prontas 'stamos, mui contentes,
Pois é nosso desejo
Que por tão alto convite
As vossas plantas eu beijo.

Canta o Pescado

Grande prazer
Temos na verdade:
Nasceu Deus menino
Por suma bondade

(Repetem todos o mesmo.)


Cantam as duas Lavadeiras

Aceitai, Jesus Menino,
Nosso coração sincero;
Aceitai, pois dentro dele
Firmemente vos venero.

Grande prazer, etc.

Cantam a 3a e 4'" Pastora

A hortaliça que trago
E também o carneirinho
Aceitai, não desprezeis,
Perdoai a oferta minha.

Grande prazer, etc.

Canta o Pescador

Este lindo robalinho
Que vós me destes na linha,
Aceitai, não desprezeis
A humilde oferta minha.

Grande prazer, etc.