Castelã (Cruz e Sousa)

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Bela e mais encantadora
Do que todas as belezas,
Graça leve de pastora
Que canta pelas devesas.

Enleios de passarinho
E brilhos de primavera,
Com magnetismos de vinho
No olhar azul de quimera.

Feita de um jorro sadio
De auroras purpureadas
Carne mais fresca que um rio
De frescas águas prateadas.

Tudo é frio e tudo é raso
Para dizer-te a capricho
Que és magnólia para um vaso,
Que és arcanjo para um nicho.

És um mito da Alemanha
Vivendo em montanha alpestre,
No castelo da montanha,
Como ardente flor silvestre.

E tens as pomas à farta
Polposas, cheias de aromas.
És assim a loura Marta
Com abundância de pomas.

Esse príncipe que te ama,
Cismando, trágico e grave,
quando o luar se derrama
Cuida ouvir-te os vôos de ave.

Ele vive, airoso e belo,
Como se vive num sonho,
No seu nevoento castelo
Junto de um lago tristonho.

E através do pó flutuante
Do luar saudoso e vago
Julga que és a garça errante
Das águas verdes do lago.