Colham-se as rosas na manhã da vida

Wikisource, a biblioteca livre

Colham-se as rosas na manhã da vida;
Ao menos, no fugir da primavera,
Das flôres os perfumes se respirem.
O peito se franqueie aos castos gosos;
Amemos sem medida, ó cara amante!

Quando o nauta, no meio da tormenta,
Vê o fragil batel quasi a afundir-se,
As praias que deixou dirige as vistas,
E tarde chora a paz que alli gosava.
Ah! quanto dera por volver o triste
Aos amigos da aldeia, ao lar paterno,
E de novo passar junto á que adora
Dias talvez sem gloria, mas tranquillos!

Assim um velho, curvo ao pêso d′annos,
Da mocidade em vão os tempos chora;
Diz: — volvei-me essas horas profanadas,
De que eu, ó céos, não soube aproveitar-me.
Só lhe responde a morte; os céos são surdos
E inflexiveis o arrojam ao sepulcro,
Não consentindo que se abaixe, ao menos
A apanhar essas flôres desprezadas.

     Amemos, vida minha!
E riamos do afan que os homens levam
Atraz de um fumo vão, que lhes consome
Metade da existencia, esperdiçada
     Em sonhos e chimeras.

Não invejemos seu orgulho esteril;
Deixemos á ambição os seus castellos.
     Mas nós, da hora incertos.
Tratemos de esgottar da vida a taça,
     Emquanto as mãos a empunham.

     Quer os louros nos cinjam
     E nos fastos sangrentos de Bellona
Nosso nome se inscreva em bronze e marmore;
Quer da singela flôr que as bellas colhem
     Se entrance a humilde c′ròa.
Vamos todos saltar na mesma praia.

De que vai, no momento do naufragio,
Em pomposo galeão ir navegando,
     Ou num batel ligeiro.
     Solitario viajante,
Ter só junto da margem bordejado?