Confissão (Maria Firmina dos Reis)

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Embalde, te juro, quisera fugir-te,
Negar-te os extremos de ardente paixão;
Embalde, quisera dizer-te: — não sinto
Prender-me à existência profunda afeição.

Embalde! é loucura. Se penso um momento,
Se juro ofendida meus ferros quebrar;
Rebelde meu peito, mais ama querer-te,
Meu peito mais ama de amor delirar.

E as longas vigílias, — e os negros fantasmas,
Que os sonhos povoam, se intento dormir,
Se ameigam aos encantos, que tu me despertas,
Se posso a teu lado venturas fruir.

E as dores no peito dormentes se acalmam.
E eu julgo teu riso credor de um favor;
E eu sinto minh’alma de novo exaltar-se,
Rendida aos sublimes mistérios de amor.

Não digas, é crime — que amar-te não sei,
Que fria te nego meus doces extremos...
Eu amo adorar-te melhor do que a vida,
Melhor que a existência que tanto queremos.

Deixara eu de amar-te, quisera um momento,
Que a vida eu deixara também de gozar!
Delírio, ou loucura — sou cega em querer-te,
Sou louca... perdida, só sei te adorar.