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Contos Populares Portuguezes/O pinto borrachudo

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XI
O PINTO BORRACHUDO

Era d’uma vez um pinto borrachudo que andava a gravetar em um monte de terra e achou lá uma bolsa de moedas e disse: — «Vou levar esta bolsa ao rei.»

Poz-se a caminho com a bolsa no bico, mas como tivesse de atravessar um rio e não podesse disse: — «Oh rio! arreda-te para eu passar.» Mas o rio continuou a correr e elle bebeu a agua toda.

Foi mais para deante e viu uma raposa no caminho e disse-lhe: — «Deixa-me passar.» Como a raposa se não movesse, comeu-a.

Foi andando e encontrou um pinheiro e disse-lhe: — «Arruma-te para eu passar.» Como elle não se arrumasse, engoliu-o.

Mais adeante encontrou um lobo e comeu-o; depois encontrou ainda uma coruja e fez-lhe o mesmo.

Chegado ao palacio do rei disse que lhe queria fallar e entregou-lhe a bolsa das moedas e o rei ordenou logo que o metessem na capoeira das gallinhas e que o tractassem muito bem. O borrachudo, logo que alli se viu, começou a cantar:

— «Qui qui ri qui,
Minha bolsa de moedas
Quero para aqui.»

E como vissem que lh’a não levavam, lançou a raposa que tinha comido, e ella comeu as gallinhas todas.

Foram dar parte a el-rei do succedido e elle ordenou que mettessem o borrachudo dentro da copeira. Compriram-se as ordens, mas o borrachudo continuou sempre a cantar:

— «Qui qui ri qui, etc.»

Depois como lhe não levassem o dinheiro, lançou o pinheiro e os copos da copeira foram todos quebrados.

Então o rei ordenou que mettessem o borrachudo na cavallariça, e elle sempre cantando:

— «Qui qui ri qui, etc.

Lançou fora o lobo e o lobo comeu os cavallos.

O rei mandou então que o mettessem no pote do azeite, mas elle lançou lá a coruja e ella bebeu o azeite.

Então o rei, não sabendo já o que havia de fazer, mandou que aquecessem o forno e que metessem lá o borrachudo; mas elle, mesmo dentro do forno começou a gritar:

— «Qui qui ri qui, etc.»

E foi lançando o rio que tinha bebido e já o palacio do rei estava quasi a afundar-se quando o rei ordenou que fossem levar a bolsa de moedas ao borrachudo e o mandassem embora, antes que elle lançasse o rio todo.

E lá se foi embora outra vez o borrachudo com a bolsa de moedas no bico.

(Coimbra.)