De Belem à concha breve
Coplas.
De Belem à concha breve,
Daquelle toſco Portal,[1]
Naõ ſò de perolas concha,
Mas concha em que cabe hum mar.
Hoje os rios vaõ correndo,
Como a centro natural,
Porque como do mar nacem,
Ao mar vão todos parar.
A ver os dous que de novo,[2]
O mar de amor quiz lançar,
Que ſaõ liquidas finezas,
Que em novas enchentes faz.
Correndo vaõ derretidos,
Por mais depreſſa chegar,
Que quem chega mais depreſſa,
He quem ſe derrete mais.
Eſtribillo.
Rios de prata,
De neve, & criſtal,
Correi a eſte centro,
Eſte mar buſcai,
Que nelle o morrer,
He nunca acabar.
II. Coplas.
O rio de ouro correndo,
Inda que pezado, vay,
E ſobre as ondas de prata
Ao Sol leva o ſeu metal.
Mas ay que farà?
Vaſe a eſte mar donde o ouro
Por diamantes trocarà.
Da Arabia dece correndo,[3]
Hum rio o mais principal,[4]
Que bem ſe vè ſer da Arabia,
Pelos aromas, que traz.
Mas ay que farà?
Vaſe a eſte mar, donde os fumos
Da grandeza perderà.[5]
O rio negro de Angola,
Adonde a mirrha ſe dà,
Vay dezejando morrer,
Donde ſe faça immortal.
Mas ay que farà?
Vaſe a eſte mar, donde fique,
O negro feito hum criſtal.
Taõ grandes ſaõ eſtes rios,
De fundo, & largura tal,
Que ſem norte, Sol, & eſtrella,
Se não pode navegar. [6]
Com elles os mares,[7]
Vaõ-ſe a eſte mar, cujas agoas,
Saõ doces ſendo de ſal.
Sejaõ dous olhos os rios,[8]
Que buſquem hoje eſte mar,
E ſeraõ rios de prata,
Num mar, que de ouro hoje eſtà:
E entaõ ſe verà,[9]
Que ſó eſte mar com tais rios,
Poderà bem redundar.[10]
Eſtribillo.
Rios de prata,
De neve, & criſtal,
Correi a eſte centro,
Eſte mar buſcai,
Que nelle o morrer,
He nunca acabar.
Notas
[editar]- ↑ Em 1691: "De ſeu groſſeiro portal,"
- ↑ Em 1691: "A ver dous mais, que de novo"
- ↑ Em 1691: "Deſce de Arabia correndo"
- ↑ Em 1691: "Hum rio muy principal"
- ↑ Em 1691: "Da grandeſa deixarà"
- ↑ Em 1691: "Se naõ pódem navegar." e em 1702 e : "Senaõ podem navegar."
- ↑ Em 1691 e 1708: "Com elles os mais,"
- ↑ Em 1691 e 1708: "Sejaõ dos olhos os rios,"
- ↑ Em 1691: "E certo ſerà,"
- ↑ Em 1691: "Se poſſa ver redundar."