Dona Infanta
Estava Dona Infanta
No jardim a passear;
Com o pente douro na mão
Seu cabelo penteava;
Lançava os olhos no mar,
Nele vinha uma armada.
Capitão que nela vinha
Muito bem a governava.
"O amor que Deus me deu,
Não virá na vossa armada?
—Não o vi, nem o conheço,
Nem a sina que levava.
"Ia num cavalo douro
Com sua espada dourada,
Na ponta de sua lança
Um Cristo douro levava.
—Por sinais que vós me destes
Lá ficou morto na guerra,
Debaixo duma oliveira
Sete facadas lhe dera.
"Quando fordes e vierdes
Chamai-me triste viúva,
Qu'eu aqui me considero
A mais infeliz sem ventura.
—Quanto me dareis, senhora,
Si vos eu trouxe-lo aqui?
"O meu ouro e minha prata,
Que não tem conta nem fim.
—Eu não quero a tua prata,
Que me não pertence a mim;
Sou soldado, sirvo ao rei,
E não posso estar aqui.
Quanto me dareis, senhora,
Si vo-lo trouxer aqui?
"As telhas de meu telhado
Que são de ouro e marfim.
—Eu não quero as tuas telhas,
Que me não pertence a mim;
Sou soldado, sirvo ao rei,
E não posso estar aqui.
Quanto me dareis, senhora,
Si vo-lo trouxer aqui?
"Três filhas que Deus me deu
Todas te darei a ti,
Uma para te calçar,
Outra para te vestir,
A mais linda delas todas
Para contigo casar.
Eu não quero tuas filhas,
Que me não pertence a mim;
Sou soldado, sirvo o rei,
E não posso estar aqui.
Quanto me dareis, senhora,
Si vos eu trouxe-lo aqui ?
"Nada tenho que vos dar
E vós nada que pedir.
—:Muito tendes que me dar,
Eu muito que vos pedir:
Teu corpinho delicado
Para comigo dormir.
"Cavaleiro que tal pede
Merece fazer-se assim:
No rabo de meu cavalo
Puxa-lo no meu jardim!
Vinde, todos meus criados,
Vinde fazer isto assim.
—Eu não temo os teus criados,
Teus criados são de mim.
"Si tu eras meu marido,
Porque zombavas de mim?
—Para ver a lealdade
Que você me tinha a mim.