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Dormido estava o silencio

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Dormi[n]do eſtava o ſilencio,
A noite de par em par,
A bom levar os Paſtores,
E ſò Deos a levar mal.

Mudo o Ecco, o Vento ſurdo,
Sem por aſſenos fallar,
Que era jà mui alta a noite,
Inda que baixo o Sol jà.

O Ar co dedo na boca,
Eſtava c'um pè no ar,
E inda que Grou parecia,
Dizendo eſtava, Crás, Cràs.

No meio de tal ſilencio,
No meio da noite tal,
Eis que o Inferno dà hum ſuſpiro,
Eis que dá o Ceo hum ay.

Ao eſtrondo das esferas
A caterva Paſtoral
Acorda, ſem dar acordo,
Deſperta, ſem deſpertar.

Hum diz: eu ſonhava agora,
Que via hum Leão Real,
Como hum Cordeiro, nos braços
De hũa Pombinha de Paz.

Diz outro: agora ſonhava
Via nacer hum Rapaz
Tão Homem, que parecia
Tamanho como ſeu Pay.

Eu ſonhei, dizia aquelle,
Via Deos entre animaes
Todo o Ceo a pé na terra,
Toda a gloria em hum Portal.

Niſto eſtavão converſando,
Quando chegou hum Zagal,
Hum Anjo na condição,
Hum Serafim no fallar.

Verdade he, lhe diz, Paſtores,
Verdade he o que ſonhais,
Que ſe o quereis ver por obra,
Logo a Belem caminhai.

Partem, chegaõ, vem, & admirão
O Sol, que em palhas eſtà,
O Fogo, que ſente o frio,
O Bem, que ſoporta o mal.

Eſtribillo.

Ay, ay, ay, que frio que vai,
Que tè o Sol buſca hum palheiro,
E naõ ſe pòde aquentar.

A Belem chegando,
Vìrão no Portal
As vidas prender,
Os ſonhos ſoltar.

O que em ſonhos vìraõ
Cumprido vem jà,
Que inda que mais cegos,
Nunca viraõ mais.

Alli conhecèrão
Que em Deos ſe humanar,
Fazia mui bem
Em fazerſe mal.

Eſtava o Minino
Dando doces ays,
Ay de quem por elle
Suſpiros naõ dà.

Como hum coco a noite
Lhe fez medo aſſaz,
Mas do medo os cocos
Soube elle zombar.

Como a neve em palhas
O Minino eſtà,
Com o que dà a entender
Se quer conſervar.

Chuva, & Sol nos olhos,
Como no Ceo faz,
Pois fazia rir,
Ver o ſeu chorar.

E vendo os Paſtores
Ao Sol tiritar,
Indo rir ao Sol,
O Sol vaõ cantar.

Eſtribillo.
Ay, ay, ay,
Que frio que vay, &c.