Em torno a mim, em maré cheia

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Em torno a mim, em maré cheia,
Soam como ondas a brilhar,
O dia, o tempo, a obra alheia,
O mundo natural a estar.

Mas eu, fechado no meu sonho,
Parado enigma, e, sem querer,
Inutilmente recomponho
Visões do que não puder ser.

Cadáver da vontade feita,
Mito real, sonho a sentir,
Sequência interrompida, eleita
Para o destino de partir.

Mas presa à inércia angustiada
De não saber a direcção,
E ficar morto na erma estrada
Que vai da alma ao coração.

Hora própria, nunca venhas,
Que olhar talvez fosse pior…
E tu, sol claro que me banhas,
Ah, banha sempre o meu torpor!