Esaú e Jacó/CII
Entretanto, a bela moça não os tirava da mesma alcova sua, por mais que buscasse deveras fugir-lhes. A memória os trazia pela mão, eles entravam e ficavam. Iam depois embora, ou de si mesmos, ou empurrados por ela. Quando tornavam, era de surpresa. Um dia, Flora aproveitou a presença para fazer um desenho igual ao que dera ao conselheiro, mais perfeito agora, muito mais acabado.
Também cansava. Então saía do quarto e ia para o piano. Eles iam com ela, sentavam-se aos lados ou ficavam defronte, em pé, e ouviam com atenção religiosa, ora um noturno, ora uma tarantela. Flora tocava ao sabor de ambos, sem deliberação; os dedos é que obedeciam à mecânica da alma. Para os não ver, inclinava a cabeça sobre o teclado; mas o campo da visão os guardava, se não era a respiração que se fazia sentir defronte ou dos lados. Tal era a sutileza dos seus sentidos.
Se fechava o piano e descia ao jardim, sucedia muita vez que os ia achar ali, passeando, e a cumprimentavam com tão boa sombra, que ela esquecia por instantes a impaciência. Depois, sem que os mandasse, iam embora. Nos primeiros tempos, Flora tinha medo que a houvessem abandonado de todo, e chamava-os dentro de si. Ambos tornavam logo, tão dóceis, que ela acabou de se convencer que a fuga não era fuga, nem eles sentiam desespero, e não os evocou mais. No jardim era mais rápido o desaparecimento, talvez pela extrema claridade do lugar. Visão pede meia sombra.