Espumas Flutuantes (1913)/Ao Dous de Julho: diferenças entre revisões

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É a hora das epopéias,
Das Ilíadas reais.
Ruge o vento-do passado
Pelos mares sepulcrais.


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É a hora, em que a Eternidade

Dialoga a Imortalidade...
Fala o herói com Jeová!...

E Deus &mdash; nas celestes plagas
&mdash;
Colhe da glória nas vagas
Os mortos de Pirajá.

Há destes dias augustos
Na tumba dos Briaréus.
Como que Deus baixa à terra
Sem mesmo descer dos céus.

É que essas lousas rasteiras
São &mdash; gigantes cordilheiras
Do Senhor aos olhos nus.
É que essas brancas ossadas

São-colunas arrojadas
Dos infinitos azuis.
Sim! Quando o tempo entre os dedos
Quebra um séc'lo, uma nação...

Encontra nomes tão grandes,
Que não lhe cabem na mão!...
Heróis! Como o cedro augusto
Campeia rijo e vetusto
Dos séc'los ao perpassar,
Vós sois os cedros da História,

A cuja sombra de glória
Vai-se o Brasil abrigar.
E nós, que somos faíscas
Da luz desses arrebóis,
Nós, que somos borboletas
&mdash; Das crisálidas de avós,

Nós, que entre as bagas dos cantos,
Por entre as gotas dos prantos
Inda os sabemos chorar,
Podemos dizer: "Das campas
Sacudi as frias tampas!
Vinde a Pátria abençoar!..."

Erguei-vos, santos fantasmas!
Vós não tendes que corar...
(Porque eu sei que o filho torpe
Faz o morto soluçar... )
Gemem as sombras dos Gracos,

Dos Catões, dos Espartacos
Vendo seus filhos tão vis...
Dize-o tu, soberbo Mário!
Tu, que ensopas o sudário
Vendo Roma-meretriz!...
Ai! Que lágrimas candentes

Choram órbitas sem luz! &mdash;
Que idéia terá Leônidas
Vendo Esparta nos pauis?!...
Alta noite, quando pena
Sobre Árcole, sobre Iena,
Bonaparte-o rei dos reis&mdash;

Que dor d'alma lhe rebenta.
Ao ver su'águia sangrenta
No sabre de Juarez!?...
Porém aqui não há grito,
Nem pranto, nem ai, nem dor...
O presente não desmente

Do seu ninho de condor...
Mãos, que, outrora de crianças
A rir&mdash; dentaram as lanças
Dos velhos de Pirajá....
De homens hoje, as empunhando,
Nas batalhas afiando,

Vão caminho de Humaitá!...
Basta!... Curvai-vos, ó povo!...
Ei-los os vultos sem par,
Só de joelhos podemos
Nest'hora augusta fitar
Riachuelo e Cabrito,

Que sobem para o infinito
Como jungidos leões,
Puxando os carros dourados
Dos meteoros largados
Sobre a noite das nações.
</poem>


[[Categoria:Texto rubricado pelo autor em 1867]]
[[Categoria:Castro Alves]]
[[Categoria:Espumas Flutuantes]]
[[Categoria:Espumas Flutuantes]]
[[Categoria:Poesia brasileira]]
[[Categoria:Romantismo brasileiro]]

Revisão das 00h21min de 29 de maio de 2015

AO DOUS DE JULHO


(recitada no theatro de S. João)


É a hora das epopéas,
Das Iliadas reaes.
Ruge o vento — do passado
Pelos mares sepulchraes.
É a hora em que a Eternidade
Dialoga a Immortalidade...
Falla o heróe com Jehovah!...
E Deus — nas celestes plagas —
Colhe da gloria nas vagas
Os mortos de Pirajá.

Ha destes dias augustos
Na tumba dos Briaréos.

Como que Deus baixa á terra
Sem mesmo descer dos céos.
É que essas lousas rasteiras
São — gigantes cordilheiras
Do Senhor aos olhos nús.
É que essas brancas ossadas
São — columnas arrojadas
Dos infinitos azues.

Sim! Quando o tempo entre os dedos
Quebra um sec′lo, uma nação...
Encontra nomes tão grandes
Que não lhe cabem na mão!...
Heróes! Como o cedro augusto
Campêa rijo e vetusto
Dos sec′los ao perpassar,
Vós sois os cedros da historia,
A cuja sombra de gloria
Vai-se o Brasil abrigar.

E nós que somos faiscas
Da luz desses arrebóes,
Nós, que somos borboletas
— Das chrysalidas de avós,
Nós, que entre as bagas dos cantos,
Por entre as gottas dos prantos
Inda os sabemos chorar,
Podemos dizer: — «Das campas

Sacudi as frias tampas!
Vinde a Patria abençoar!...

Erguei-vos, santos fantasmas!
Vós não tendes que corar...
(Porque eu sei que o filho torpe
Faz o morto soluçar...)
Gemem as sombras dos Gracchos,
Dos Catões, dos Spartacos,
Vendo seus filhos tão vis...
Dize-o tu, soberbo Mario!
Tu, que ensopas o sudario
Vendo Roma — meretriz!...

Al! Que lagrimas candentes
Choram orbitas sem luz!
Que idéa terá Leonidas
Vendo Sparta nos paúes?!...
Alta noite, quando pena
Sobre Arcole, sobre Iena,
Bonaparte — o rei dos reis,
Que dôr d′alma lhe rebenta.
Ao ver su′aguia sangrenta
No sabre de Juarez?!...

Porém aqui não ha grito,
Nem pranto, nem ai, nem dôr...
O presente não desmente
Do seu ninho de condor...

Mãos, que, outr′ora de crianças
A rir — dentaram as lanças
Dos velhos de Pirajá...
De homens hoje, as empunhando,
Nas batalhas afiando,
Vão caminho de Humaitá!...

Basta!... Curvai-vos, ó povo!...
Eil-os os vultos sem par,
Só de joelhos podemos
Nest′hora augusta fitar
Riachuelo e Cabrito,
Que sobem para o infinito
Como jungidos leões,
Puxando os carros dourados
Dos meteóros largados
Sobre a noite das nações.

Bahia — 1867.