Fabulas de Narizinho/O asno pedante e o burro humilde
humilde
Um asno pachola e pedantissimo atormentava a paciencia dum humilde burro de corroça, desses que reconhecem o seu lugar na terra. Zurrava o asno, declamava, provava que era elle um talento de primeira grandeza, e sabio como nunca appareceu igual no mundo.
O outro, quieto, ouvia, de orelhas murchas, pastando.
— Que bruto és, amigo! Falo e não me respondes! Zurro sciencia pura e tu pastas! Vamos! Dize alguma coisa! Contraria-me, contesta-me as opiniões, que estou a arder por uma polemica. Do contrario envergonhar-me-hei de ter-te como irmão na fórma e na côr.
Um macaco, que tudo ouvia, comendo bananas num galho de pão, não se conteve e desfechou uma gargalhada.
— O mundo está perdido ! Esta besta a fazer-se de sabio, a zurrar centenas de asneiras e o auditorio a engulir tudo, caladinho...
O burro humilde replicou:
— Não zombes do coitado— porque é um coitado, não vês? Quanto a mim faço bem em não responder. O poeta Bocage ensinou-me estes versinhos que são profundamente verdadeiros:
Um tolo só em silencio
E' que se póde soffrer...
Esta obra entrou em domínio público pela lei 9610 de 1998, Título III, Art. 41.
Caso seja uma obra publicada pela primeira vez entre 1929 e 1977 certamente não estará em domínio público nos Estados Unidos da América.