Flores do Mal/A Corveta
LIII
A Corveta
Eu quero descrever, preguiçosa beldade,
Os peregrinos dons da tua mocidade;
Esse dotes soberanos
Em que se alia a infância ao fulgor dos trinta anos.
Quando passas, movendo as saias, pelo asfalto,
Lembras uma corveta a singrar no mar alto,
As velas pandas ao vento,
Num rítemo suave, enlanguescido e lento.
Sobre o pescoço forte e cheio, donairosa,
A cabeça gentil meneias, radiosa;
Com majestade e bonança,
Prossegues tua marcha, imponente creança.
Eu quero descrever, preguiçosa beldade,
Os peregrinos dons da tua mocidade;
Esses dotes soberanos
Em que se alia a infância ao fulgor dos trinta anos.
Teu colo, a palpitar, soerguendo o vestido,
Teu colo triunfal lembra um movel polido
De abaulados gavetões
Como argênteos broqueis, despedindo clarões;
Provocantes broqueis com bicos côr de rosa!
Armário encantador, despensa primorosa
Com manjares escolhidos,
E vinhos de embriagar a alma e os sentidos!
Quando passas, movendo as saias, pelo asfalto,
Lembras uma corveta a singrar no mar alto,
As velas pandas ao vento
N’um rítemo suave, enlanguescido, e lento.
As tuas pernas, sob as saias que as apertam,
Castigam as paixões obscuras que despertam,
Como duas feiticeiras
Mexendo um filtro negro em fundas cafeteiras.
Teus braços, que não teem temor aos mais valentes,
Possuem o condão das gibolas luzentes;
Podem abraçar o eleito,
E, apertando-o com força, imprimi-lo ao teu peito.
Sobre o pescoço forte e cheio, donairosa,
A cabeça gentil meneias, radiosa;
Com majestade e bonança
Prossegues tua marcha, imponente creança!