I-Juca-Pirama/Canto V
V.
Soltai-o! — diz o chefe. — Pasma a turba;
Os guerreiros murmurão: mal ouvirão,
Nem poude nunca um chefe dar tal ordem!
Brada segunda vez com voz mais alta,
Afrouxão-se as prisões, a embira cede,
A custo, sim; mas cede: o estranho é salvo.
— Tymbira, diz o indio enternecido,
Solto apenas dos nós que o seguravão:
És um guerreiro illustre, um grande chefe,
Tu que assim do meu mal te commoveste,
Nem soffres que, transposta a natureza,
Com olhos onde a luz já não scintilla,
Chore a morte do filho o pai cansado,
Que somente por seu na voz conhece.
— És livre; parte.
— E voltarei
— Debalde.
— Sim, voltarei, morto meu pai.
— Não voltes!
É bem feliz, se existe, em que não veja,
Como seu filho chora: és livre; parte.
— Acaso tu suppões que me acobardo,
Que receio morrer!
— És livre; parte!
— Ora não partirei; quero provar-te
Que um filho dos Tupis vive com honra,
E com honra maior, se acaso o vencem,
Da morte o passo glorioso affronta.
— Mentiste, que um Tupi não chora nunca,
E tu choraste!.. parte; não queremos
Com carne vil enfraquecer os fortes.
Sobresteve o Tupi: — arfando em ondas
O rebater do coração se ouvia
Precipite. — Do rosto afogueado
Gelidas bagas de suor corrião:
Talvez que o assaltava um pensamento...
Já não... que na enlutada fantasia,
Um pesar, um martyrio ao mesmo tempo,
Do velho pai a moribunda imagem
Quasi bradar-lhe ouvia: — Ingrato! ingrato!
Curvado o collo, taciturno e frio,
Espectro d’homem, penetrou no bosque!