João Ferreira de Almeida 1819 (ortografia atualizada)/Marcos/IV

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  1. E COMEÇOU outra vez a ensinar junto ao mar, e ajuntou-se a ele grande companhia, de tal maneira que, entrando em um barco, se assentou no mar; e toda a companhia estava em terra junto ao mar.
  2. E ensinava-lhes por parábolas muitas coisas; e dizia-lhes em sua doutrina:
  3. Ouvi, vedes aqui o semeador saiu a semear;
  4. E aconteceu que, semeando ele, caiu uma parte da semente junto ao caminho, e vieram os pássaros do céu, e a comeram.
  5. E outra caiu em pedregais, aonde não tinha muita terra; e logo nasceu, porque não tinha terra funda.
  6. Mas saindo o sol, queimou-se; e porque não tinha raiz, secou-se.
  7. E outra caiu entre espinhos, e cresceram os espinhos, e afograram-na, e não deu fruto.
  8. E outra caiu em boa terra, e deu fruto, que subiu, e cresceu; e deu um trinta, e outro sessenta, e outro cento.
  9. E disse-lhes: quem tem ouvidos para ouvir, ouça.
  10. E quando esteve só, perguntaram-lhe os que junto a ele estavam, com os doze, acerca da parábola.
  11. E disse-lhes: A vós outros vos é dado saber os mistérios do Reino de Deus; mas aos que estão de fora, todas estas coisas por parábolas se lhes dizem.
  12. Para que vendo, vejam, e não advirtam; e ouvindo, ouçam, e não entendam; porque porventura se não convertam, e lhes sejam perdoados os pecados.
  13. E disse-lhes: Não sabeis esta parábola? como pois entendereis todas as parábolas?
  14. O semeador é o que semeia a palavra.
  15. E estes são os de junto ao caminho, nos que a palavra se semeia; mas havendo-a ouvido, vem logo Satanás, e tira a palavra que em seus corações foi semeada.
  16. E semelhantemente estes são os que se semeiam em pedregais: os que havendo ouvido a palavra, logo com gozo a recebem.
  17. E em si mesmos não têm raiz; antes são temporais. Depois levantando-se a tribulação, ou perseguição por causa da palavra, logo se escandalizam.
  18. E estes são os que se semeiam entre espinhos: a saber, os que ouvem a palavra.
  19. E os cuidados deste mundo, e o engano das riquezas, e as cobiças acerca das outras coisas, entrando, afogam a palavra, e fica sem fruto.
  20. E estes são os que foram semeados em boa terra: os que ouvem a palavra, e a recebem, e dão fruto, um trinta, e outro sessenta, e outro cento.
  21. E disse-lhes: Vem porventura a candeia para se pôr debaixo do alqueire, ou debaixo da cama? não vem antes para se pôr sobre o candeeiro?
  22. Porque não há nada encoberto que não haja de ser manifesto; nem nada se faz para ficar encoberto, mas para ser descoberto.
  23. Se alguém tem ouvidos para ouvir, ouça.
  24. E disse-lhes: Olhai o que ouvis; com a medida que medirdes vos medirão; e ser-vos-á acrescentado a vós outros o que ouvis.
  25. Porque ao que tem, ser-lhe-á dado; e ao que não tem, até o que tem lhe será tirado.
  26. E dizia: Assim é o Reino de Deus, como se o homem lançasse semente na terra.
  27. E dormisse, e se levantasse de noite e de dia, e a semente brotasse, e crescesse, não sabendo ele como.
  28. Porque de si mesma frutifica a terra, primeiro erva, depois espiga, depois grão cheio na espiga.
  29. E quando já o fruto se mostra, logo lhe envia a foice, porquanto chegada é a sega.
  30. E dizia: A que assemelharemos o Reino de Deus? ou com que parábola o compararemos?
  31. Com o grão da mostarda, que quando se semeia na terra, é o mais pequeno de todas as sementes que na terra .
  32. E sendo já semeado, sobe, e faz-se a maior de todas as hortaliças, e cria grandes ramas, de tal maneira, que os pássaros do céu se possam aninhar debaixo de sua sombra.
  33. E com muitas tais parábolas lhes falava a palavra, segundo o que podiam ouvir.
  34. E sem parábola não lhes falava; mas a seus Discípulos declarava tudo em particular.
  35. E disse-lhes aquele dia, vinda já a tarde: passemos à outra banda.
  36. E deixando a companhia, o tomaram consigo como estava no barco, e havia também com ele outros barquinhos.
  37. E levantou-se uma grande tempestade de vento, e davam as ondas por cima do barco, de tal maneira que já se enchia.
  38. E ele estava na popa dormindo sobre uma almofada, e despertaram-no, e disseram-lhe: Mestre, não se te dá de que nos perdemos?
  39. E desperto ele, repreendeu ao vento, e disse ao mar: Cala-te, aquieta-te. E quietou-se o vento, e fez-se grande bonança.
  40. E disse a eles: Por que sois tão tímidos[1]? como, não tendes fé?
  41. E temeram com grande temor, e diziam uns aos outros: Mas quem é este, que até o vento e o mar lhe obedecem?

Notas[editar]

  1. tímidos, aqui, significa covardes