Lucrécias/XIII - Ignez
— Lembras-te Ignez?
À sombra d’esta mangueira
aquela vez?
— Eras então mais fagueira,
Não eras má!
E a vida mais prazenteira
Do que hoje ‘stá!
— Tinhas talvez...
Tinhas... quantos anos tinhas,
Lembras-te, Ignez?
“ São coisas das Afonsinhas,
Já lá se vão...
Eu sei cá essas coisinhas
De quanto são.
— Que desamor!
Não te lembras do passado?
“ Eu não, senhor.
“ Anda-me o tempo ocupado
Dos dias meus
Co’o meu maridinho amado,
O sô Mateus.
— Casaste, pois?
“ Tal e qual...
— Tens bom marido?
“ Vale por dois,
“ Seja-me o fado servido
De o conservar,
Como até hoje o tem sido
Desde o altar,
“ E eu lhe direi
Se a sorte de outra casada
Lhe invejarei.
“ Também fiel, desvelada
Mulher assim,
Não lhe há de ser apontada
Depois de mim.
— Com que então,
Fizeste um bom casamento?
“ Foi de encher a mão!
“ E tenho o contentamento
De lhe dizer
Que irei morrer num convento
Se ele morrer.
— Ora esta Ignez!
E há quantos anos casaste?
“ Vai fazer um mês.
— Há poucos dias...
“ Afaste!
Veja o que faz! Querer em beijar? sô traste!
É muito audaz!
— Como és cruel!
Não quero beijar-te, quero
Dar-te este anel.
“ Vá-se d’aí...
Como é fero
Teu coração!
Não há peito mais austero,
Por Deus, que não!
“ Prezo-me assim...
Já não és a Ignez d’outrora...
“ Pois sim, pois sim!
— Adeus, Ignez, vou-me bem’ora,
Deixa-te, ‘star!...
Toma o anel; deita-o fora
E este colar.
“ Lá isso não,
Por soberba não rejeito
O que me dão.
— Então aceitas?
“ Aceito...
— Querida Ignez!
“ Eu não... Talvez...
Valha-me Deus!
Quem vem aqui manquejando?
É sô Mateus!...
“ Fuja, fuja! vá-se andando
Com pés de lan...
— Adeus, Ignez... até quando?
“ Volte amanhan...