Lucrécias/XI - Mal de um beijo

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— Dá-me um beijo! pode um beijo
Deixar-me acaso senão?
Eu sei beijar tão leve...
Dá-me o beijo, Lídia?
— Não.
 
Mesquinha! pródigas outras
Quantos beijos aí dão?...
Não sejas pródiga, emb’ora,
Mas... um beijo ao menos?
— Não.
 
— Não te peço um sacrifício
Em paga d’este vulcão,
Que trago dentro do peito,
Dá-me um beijo em paga?
— Não.
 
—Inferno! Que amante és Lídia,
Pois sempre a dizer-me não,
Quando um beijo te suplico
Nos ardores da paixão?...
 
— Que me pedes para prova
De minha extrema paixão?
Vai dizendo, verás, Lídia,
Que não sei dizer-te — Não.
 
— Há de compor um romance,
Que fale somente em mim,
Que acima das moças todas
Me punha em beleza?
— Sim.
 
— Não há de deixar que eu viva
Por muitos meses assim
Aborreço o meu estado...
— Sim, Lídia, três vezes sim.
 
É toda a minha ventura
Casar-me, meu serafim;
Assim queiras... queres?
— Quero!
— Está dito... beijo?
— Sim!
 
———
 
E beijei-a... Mas o beijo
Arrefeceu-me a paixão...
Hei de compor-lhe o romance;
Mas casar com Lídia? — Não.