Marabá
MARABÁ.
Eu vivo sosinha; ninguem me procura!
Acaso feitura
Não sou de Tupá!
Se algum d’entre os homens de mim não se esconde,
— Tu és, me responde,
— Tu és Marabá!
— Meus olhos são garços, são côr das saphiras,
— Tem luz das estrellas, tem meigo brilhar;
— Imitão as nuvens de um céo anilado,
— As cores imitão das vagas do mar!
Se algum dos guerreiros não foge a meus passos:
«Teus olhos são garços,
«Responde anojado; mas és Marabá:
«Quero antes uns olhos bem pretos, luzentes,
«Uns olhos fulgentes
«Bem pretos, retinctos, não côr de anajá!»
— É alvo meu rosto da alvura dos lyrios,
— Da côr das areias batidas do mar;
— As aves mais brancas, as conchas mais puras
— Não tem mais alvura, não tem mais brilhar. —
Se ainda me escuta meus agros delirios:
«És alva de lyrios
«Sorrindo responde; mas és marabá:
«Quero antes um rosto de jambo corado,
«Um rosto crestado
«Do sol do deserto, não flor de cajá.»
— Meu collo de leve se encurva engraçado,
— Como hastea pendente de cactos em flor;
— Mimosa, indolente, resvalo no prado,
— Como um soluçado suspiro de amor! —
«Eu amo a estatura flexivel, ligeira,
«Como uma palmeira
«Então me respondem; tu és Marabá:
«Quero antes o collo da ema orgulhosa,
«Que pisa vaidosa,
«Que as floreas campinas governa, onde está.»
— Meus loiros cabellos em ondas se annelão,
— O oiro mais puro não tem seu fulgor;
— As brisas nos bosques de os ver se enamorão,
— De os ver tão formosos como um beija-flor! —
Mas elles respondem: «Teus longos cabellos,
«São loiros, são bellos,
«Mas são annelados; tu és Marabá:
«Quero antes cabellos, bem lisos, corridos,
«Cabellos compridos,
«Não côr d’oiro fino, nem côr d’anajá.»
E as doces palavras que eu tinha cá dentro
A quem n’as direi?
O ramo d’acacia na fronte de um homem
Jámais cingirei:
Jámais um guerreiro da minha arasoya
Me desprenderá:
Eu vivo sosinha, chorando mesquinha,
Que sou Marabá!