O Último Palpite
O caso que vou narrar não é inventado; passou-se, não há muito tempo, no bairro do Engenho Velho.
Havia ali uma família que se deixou dominar pelo jogo do bicho, a ponto de não pensar em outra coisa. Desde pela manhã até à noite havia naquela casa dois assuntos exclusivos de todas as conversas: o bicho que tinha dado e o bicho que ia dar.
O chefe da família era um cardíaco, e quero crer que foram as emoções do jogo que o atiraram na cama para nunca mais se levantar.
Momentos antes de morrer, o pobre homem, cercado pela mulher e os filhos, acenou como se quisesse dizer alguma coisa. A senhora debruçou-se sobre ele, e o moribundo, fazendo um esforço supremo, proferiu estas palavras:
— Joga tudo no cachorro!
Cinco minutos depois exalava o último suspiro.
A viúva, na ocasião em que, debulhada em lágrimas, dava as necessárias ordens para o enterro, lembrou-se, por pegar em dinheiro, da recomendação do defunto; chamou o copeiro e disse-lhe:
— José, vai jogar dez mil-réis no cachorro. Não creio que dê, porque ainda anteontem deu, mas devo respeitar o último palpite do meu marido. É um palpite sagrado!
Toda a vizinhança soube da coisa, e não houve bicho careta que não jogasse no cachorro. Os bicheiros do bairro levaram um tiro, porque efetivamente foi o cachorro que deu.
Quando vieram trazer os duzentos mil-réis à viúva, ainda não tinha saído de casa o cadáver do marido.
Ela ficou desesperada, e, abraçando o caixão, exclamou entre lágrimas, com grande espanto das pessoas presentes:
— Perdoa, Manuel, perdoa! Tu me disseste que jogasse tudo no cachorro, e eu joguei apenas dez mil-réis! Agora vejo que estavas inspirado pela bondade divina, e querias deixar tua família amparada!... Recebi apenas duzentos mil-réis! Perdoa Manuel, perdoa!