O Café
Aquele pequeno café da rua General Câmara, quase no canto da Primeiro de Março, era, talvez, o mais afreguesado da cidade. A concorrência entre as duas e as quarto, quando os empregados do grande comércio do bairro saem para tomar a sua canequinha, era enorme. As mesas apertavam-se umas de encontro às outras, e tamanha era a falta de espaço e de cadeiras, que o sr. Joaquim, dono do estabelecimento, tomou, um dia, uma resolução inteligente.
— De hoje em diante — disse — o café, a quem o tomar de pé, custará mais barato.
E fazendo o preço:
— A freguês sentado, dois tostões; a freguês em pé, cento e sessenta!
Foi nessa casa afreguesadíssima que o Antônio Dias foi ter, uma tarde, com a garganta ardendo de poeira e o estômago em protestos, com fome. Desempregado há quase um mês, havia devorado, já, todo o pequeno saldo que o patrão lhe entregara. O colarinho sujo, os punhos pegajosos, as botinas sem graxa, a barba de oito dias, a roupa sem escova, diziam o que vinha sendo a sua vida, percorrendo o comércio, à procura de uma colocação.
Antes de entrar no café, o Antônio consultou os recursos: restava-lhe apenas um tostão, um ínfimo níquel de cem mil réis, que se perdia, miúdo, no fundo imenso do bolso, e que ele acariciava de instante a instante, com grandes sustos no coração. Certo de que a moeda estava ali, enfiou pela casa, parou entre as mesas, e, perscrutando o ambiente, procurou, com os olhos, um "garçon".
Um acorreu, solícito:
— Um cafezinho?
— Quanto custa um café? — indagou, tímido, o Antônio.
— Sentado, dois tostões... De pé, cento e sessenta.
O rapaz esfriou. A moeda de cem mil réis suava-lhe na mão suja, mergulhada no bolso. Excitado pelo cheiro do café, o organismo recusava distanciar-se dali, os pés pregados no chão. E foi, então, quando o desgraçado teve uma idéia.
— Mocó, — gemeu, dê-me um por um tostão...
E quase chorando:
— Eu tomo de cócoras!...