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O Revólver

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Aquela hora da noite, a praça Mauá dormia o sono profundo das pedras, embalada, apenas, pelo barulho monótono dos guindastes, que arrebatavam pausadamente nas garras de ferro, para depositar em terra, a carga do poderoso transatlântico. A bordo, vultos andavam no convés, acima e abaixo, na faina das últimas ordens. As vigias apagavam-se, como os olhos de um Argos que começassem a adormecer. Fora, no cais, passadas vigorosas e tristes, apenas o guarda-civil, encarregado da ronda.

De repente, aproxima-se do portão que dá acesso aos navios, um inglês. Alto, louro, vermelho, mãos nos bolsos, cachimbo no queixo, tipo legítimo de marujo britânico. O andar medido, e seguro, denuncia o homem que trazia dez "whiskys" no estômago.

À entrada, quase, do portão, sente que lhe batem no braço.

— "Do you speak english?"

— "Yes, yes!" — responde o "beef", voltando-se, e vendo ao seu lado, miúdo, pequeno, apertadinho na sua roupa cintada, um rapazola imberbe, carinha de moça, tipo clássico de almofadinha.

Esperava que o seu interlocutor continuasse na mesma língua em que fizera a consulta, quando este explica, um legítimo português da Avenida:

— Então, me venda um revolverzinho assim!

E indicava, com as duas mãos, uma longe da outra, um tamanho de uns vinte centímetro.

— Oh, mim não compreende! — respondeu-lhe o inglês, dando de andar.

— Um revolverzinho assim! — tornou o "almofadinha", perseguindo-o. — Assim...

E como o oficial não desse mostras de compreender o que era:

— Um revolverzinho! Sabe! Um re-vol-ver-zinho!

E, levando, para explicar-se melhor, a mão direita ao bolso traseiro da calça, onde se costma trazer o revolver, fez, de novo, o tamanho da arma.

— Ah, senhorr, mim non tem dessa tamanho! — fez o inglês, olhos vivos, como quem parece ter compreendido.

E já com a mão no portão, ao ouvido do rapaz, para o guarda não ouvir:

— Quem tem desse tamanho é... é... senhorr comandante...

E tomou, firme, o rumo da prancha.