Ofício do Governador D. Manuel de Portugal e Castro, 1823-08-23

by D. Manuel de Portugal e Castro

« Ill.mº e Ex.mº - Snr. Tenho a participar a V. Ex.ª - que tendo partido desse porto de Lisboa no dla 22 do corrente cheguei a este no dia 26 pelas onze horas da manhã. Logo que a Fragata « Amazonas », que me conduzia, deu fundo, enviei pelo Capitão do 7.° Regimento de Infanteria, Manuel Izidro da Paz, o oficio da cópia inclusa ao Governador, António Manuel de Noronha, mandando-lhe dizer pelo dito Capitão, que a bordo da Fragata se achava uma Alçada composta de seis Ministros, que Sua Magestade houvera por bem mandar a esta Ilha, a fim de que o dito Governador desse todas as providências para se lhe fazer a apresentadoria, que em tais casos as Reais Ordens determinão. Este meu procedimento foi todo de acordo, com o Coronel Comandante das Tropas desta Ilha, Tiago Pedro Martins.

Duas horas pouco mais ou menos depois de ter mandado o meu dito oficio ao Governador Noronha, chegou um escaler destinado a conduzir-me para terra, em que vinha o Capitão Paz e os Ajudantes de Ordens do Governo. O Governador Noronha não respondeu ao meu oficio por escrito, mandando-me dizer, que pelo que respeitava ao aquartelamento da Tropa, que S. M. destinava para guarnição d'esta Ilha, ele ia dar todas as providências na forma por mim requeridas; enquanto porém a Alçada me declarava seria mais conveniente ao sossego público; não desembarcar imediatamente pela impressão que causaria nos animos dos habitantes desta cidade a que lhe parecia melhor deferir e o seu desembarque para o dia se depois que eu e a Tropa que vinha, para a guanição desta Ilha, tivessemos efectuado o nosso.

Comuniquei tudo quanto acima refiro aos Ministros da Alçada e Coronel Comandante da Tropa, os quais assentarão em que eles Ministros ficassem a bordo da Fragata até o dia seguinte, e que naquele somente viesse para terra eu e toda a Tropa, o que se praticou com a melhor ordem possível. lnformei-me do Capitão Paz do que lhe tinha parecido sobre a disposição dos habitantes desta Cidade com a chegada da Tropa, o qual me disse. que no curto espaço de tempo, que se tinha demorado em terra, assim como das.poucas pessoas com quem tinha falado, lhe parecia que nada havia a recear das sábias e paternais medidas que S. M. se dignara tomar a bem da tranquilidade desta Ilha antes se felicitavão antevendo um feliz resultado para os seus habitantes.

Apenas recebi tão gratas notícias deliberei-me a vir para terra somente acompanhado dos Ajudantes de Ordens deste Governo e sobredito Capitão Paz, parecendo-me que com esta minha resolução patenteava a confiança de que o povo desta Cidade jamais se oporia a reconhecer a autoridade que S. M. em mim depositará.

O meu desembarque foi feito com todas aquelas formalidades que em semelhantes casos se costumão praticar. As seis horas e meia da tarde tinha desembarcado toda a Tropa da expedição, observando-se estritamente, neste acto, tudo quanto determinavão as Reais Ordens a tal respeito.

Devo mencionar a V. Ex.ª que tendo-se reservado para o diga 27, imediato ao do meu desembarque, efectuar-se o da Alçada pelas razões já referidas, aconteceu o dissabor de garrar nessa noite a Fragata, a cujo bordo ela se achava, sendo obrigada a fazer-se de vela, ainda não pude fundear neste porto estando contudo a vista do mesmo. Apesar de ser este acontecimento mui vulgar nesta costa, ele me tem mortificado extraordinariamente.

Depois que saltei em terra tem sido todos os meus desvelos sondar os animos das pessoas com quem tenho falado sobre as suas opiniões políticas, parecendo-me que todas elas tendem a querer viver debaixo do justo e sábio governo de El Rei Nosso Senhor .

Todas as notícias que for coligindo sobre um tão importante objecto as irei sucessivamente participando a V. Ex.ª - com aquela fidelidade e verdade, que devo à Sagrada Pessoa de S. M. e que formão o meu carácter. O Governador, António Manuel de Noronha, é aqui geralmente benquisto, nada posso por ora dizer a V. Ex.ª da sua conduta se tem sido pouco considerada ou criminosa no exercício do emprego, que S. M. lhe confiou, ele parte amanhã na charrua, a qual não demoro mais tempo, por julgar que será do Real Agrado de S. M. saber quanto antes notícias deste país.

Neste momento seis horas da tarde acabo de receber a participação de ter fundeado a Fragata « Amazonas » e terem já desembarcado os Ministros da Alçada que se achavam a seu bordo, estou portanto livre do cuidado que me causou o sucesso que acima relatei. Ontem pelas onze horas da manhã tomei posse deste Governo com as costumadas formalidades; depois da dita posse dei eu mesmo na frente de toda a Tropa, que para esta acção se achava postada, os vivas a El Rei Nosso Senhor e a toda a Real Família, os quais forão correspondidos, tanto pela mencionada Tropa como pelo infinito povo, que se achava presente com o maior entusiasmo e alegria, que me causou a mais completa satisfação.

Sobre os diferentes artigos conteúdos nas instruções secretíssimas, que por ordem de S. M. V. Ex.ª me transmitiu, não posso ainda dar cabal cumprimento por serem sobre objectos que exigem tempo e conhecimento da probidade das pessoas com quem me devo informar, protestando eu a V. Ex.ª que executarei escrupulozissimamente todas as Reais Determinações dando fiel conta de tudo quanto chegar ao meu conhecimento.

A vinda da Alçada tem feito grande comoção nos animos, mas ainda tem sido muito maior o espalhar-se por cartas de Lisboa, que o Batalhão de Artilharia desta Ilha devia ser dela removido. Consultando como me foi ordenado o parecer do Coronel Comandante da força armada e o dos Magistrados da Alçada sobre a remoção do referido Batalhão, expus-lhes as notícias que tinha podido adquirir, tanto da impressão que tal novidade causou nesta cidade, como as que o meu antecessor me tinha produzido de que jamais descobrira indícios no dito Batalhão contrarias ao Governo de S. M. Fui de opintão que não embarcasse com a qual se conformou o Coronel Comandante e cinco dos Magistrados da Alçada, sendo do parecer contrario o Desembargador, Luís de Paula Furtado de Mendonça, dizendo que as razões ponderadas não erão os graves inconvenientes de que tratão as instruções…».