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Russos


Eu sou um dos muitos que mal pode entender como é possível o regime soviético se manter já há mais de uma década na Rússia. Como eu nunca estive na Rússia, também não me cabe fazer um julgamento sobre o caráter do povo russo, ainda mais agora que o gigantesco território abrange as mais diversas raças e grupos étnicos; mas me é permitido contar um episódio que vivenciei e que talvez seja típico.

Na construção de nossa estrada de ferro foram contratados trezentos russos que tinham vindo direto de Odessa e cabe assinalar: antes da Grande Guerra![1] Eram belas figuras altas com olhos de um azul claro e maneiras calmas. No entanto, não gostavam do trabalho e da comida. Depois de pouco tempo, nenhum deles apareceu mais no canteiro de obras. Acamparam na última estação em volta das cantinas, e em função de lá não haver ranchos suficientes, sem delongas eles ocuparam os vagões de carga vazios e lá firmaram residência. Mas os vagões se tornaram necessários e em vão os funcionários da estação lograram expulsá-los de lá. O intérprete conversou e praguejou. Tudo inutilmente! Pelas pernas eles foram retirados dos vagões sem que pudessem resistir, mas entraram de novo arrastando-se pelo outro lado, tão logo nossos homens se afastaram.

Eu era chefe de setor e o diretor norte americano mandou me chamar e me encarregou de tomar os vagões de um jeito ou de outro. “Está bem!” disse eu. “Mas para levar o pessoal, eles devem antes de qualquer coisa ser pagos”. Ele também compreendeu isso e colocou dinheiro e o tesoureiro à

 

  1. Refere-se obviamente a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) pois no momento da redação de seu livro ainda não ocorrera a Segunda Grande Guerra (1939-1945). (NdH)