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A esperança

 

Ora, eoleos harpejos que se perdem
Nas regiões do Eterno;
Ora, horrisonos eccos, que restrugem,
Como uma gargalhada de Manfredo,
Nas gargantas do inferno.

Eccos de maldição, de amor ou lugubres,
Seus varios murmurios,
Parte, abafa no gelo do cadaver,
Parte, trasluz dos goivos d'esta senda
Nos limpidos rocios.

A rosa que desmaia emmurchecida
A' beira do jazigo,
Tem mais valor p'ra mim, é mais fragrante,
Que a rosa que do baile adorna as salas
Da opulencia no abrigo.

Esta, apoz lá perder os seus perfumes,
Vai no lodo da rua
Ennodoar o alvor; aquella esfolha,
E depois d'esfolhada inda a saúdam
A aurora, o orvalho, a lua.

A lagrima ― esta flor dos jardins d'alma ―
Como a pallida rosa,
E' mais nobre que o magico sorriso
Quando a face da virgem soffredora
Percorre silenciosa.

Se ha ahi alguem que o afflictivo pranto,
Satanico escarneça...
Nunca um gemido o coração lhe solte!
Ninguem lhe leve á campa uma saudade
Quando ao tumulo desça!

Oh! não interrogueis se é pura a lagrima,
Que a debil fronte inunda!
Dos vendavaes que vão n'uma alma errante
E' sempre o aguaceiro, é sempre o sangue
De uma ulcera profunda!

Eu vergo-me ante o pranto, eu tremo ante essa
Linguagem da agonia,
Como ante a força de poder immenso,
Como ante a voz da predicção terrivel
O povo hebreu tremia.

Eu vergo-me ante a dôr, eu que ante as galas
A curvar-me não desço.
Adeptos da indiff'rença! o mundo é vosso:
Não queiraes conhecer-me, é vossa a estrada;
Passai; ― não vos conheço!

Dezembro ― 1864.

Ernesto Pinto D'Almeida.

 

 

Maria Isabel

por

Maria Peregrina de Sousa

Dedicado á memoria de minha irmã

(Continuado da pag. 136)

XVII

Desesperação e conforto

Passaram-se oito dias sem novidade. Amaral ia diariamente a casa da snr.a D. Ermelinda para se consolar da morte proxima de sua esposa. Devia esta [que passava muito bem] ter ainda vida, á necessidade que Amaral teria de passar muitos dias sem ver a filha de Ricardo d'Oliveira, logo que se annunciasse a esta a morte d'ella; e Amaral estava muito namorado. Quan-