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A esperança

 

ctir, ás escuras, sobre o modo mais airoso de romper o segredo sem o romper. Não achei outro meio senão o de assumir authoridade episcopal, e chrismar toda a gente que pegava ao fio da meada. Em potencia inventiva a minha cabeça é mesmo uma desgraça.

E pondo aqui o fecho a esta carta, vou dar-lhe uma prova da verdade d'essa asserção na canha exposição que passo a fazer-lhe das taes coisas de segredo, pedindo-lhe que lhe dê a mais bonita feição do que eu sei dar-lhe, para satisfação dos dias de velhice do seu amigo

E. A. Salgado.

(Continua).

 
 
Perguntas e respostas

L'exilé partou est seul!
Lamennais ― Paroles d'un croyant.

― D'onde vens? ― «Venho das trevas...»
― Onde vaes? ― «Vou para a luz...»
― Tão curvada a fronte levas!
― «Que admira?... é o peso da cruz!»

― Não tens mãe? ― «Deixei-a morta:
Quando sahi do meu lar
A orphandade estava á porta
Sentada no limiar.»

― Não tens irmãs? ― «Já tive uma:
Foi a estrella da manhã
Que se perdeu entre a bruma
D'um jazigo!.. Ai! pobre irmã!»

― Não tens amigos? ― «Conheço
Uns homens, que o dizem ser,
Mas se um abrigo lhes peço.
Nunca mais os torno a vêr!»

― Não tens amante? ― «A ironia
D'essa pergunta é cruel!
Tu vês a taça vasia
E vens encher-m'a... de fel.»

― E inda crês? ― «Creio no Eterno.
O soffrimento é chrysol...
A's vezes, em pleno inverno,
Tambem ha dias de sol!»

Guilherme Braga.

 
 
Desapontamento[1]

Eramos sós n'uma sala;
ella em silencio, eu fallava,
e a mim tremia-me a falla....
e a ella a mão que eu beijava.

Amo-te, disse-lhe, e ella
corou, como adivinhando
que, se pallida era bella,
era mais bella corando.

Pedi-lhe, sorrindo, um beijo,
e ella curvou a cabeça,
e depois disse com pejo:
«Não é coisa que se peça!»

Não é?!.. Mas rouba-se... e n'isto
(vejam como eu ficaria!)
á porta da sala avisto....
um priminho que se ria.

Alexandre da Conceição.

^(1)  Nota illustrativa. O author d'estas linhas sabe que desapontamento é um anglicismo ou um galicismo; mas commette o delicto de leza linguagem, conscio da futilidade da versalhada.