Eu já medi esse espaço,
Abracei já horisontes,
Vi planicies, vi montes,
Agora... só vejo a Deus!...
Que fôra o mundo se a luz
Lhe não désse — graça e vida? —
A vastidão desmedida
D'esse gigante do mar?!
Que foram? Mas negro abysmo
Cerra á mente os teus horrores,
Que então... nem estrêllas nem flôres,
Trevas... lucto... horror sem par!—
E é esse o quadro d'est'alma!
Eis quanto eu goso, o que eu sinto!
E' esse o quadro; não minto,
Não ha desgraça maior!
Andar sempre infirme o cego
N'um mundo que se lhe esconde
Sempre! e nunca saber onde!...
E ao homem superior!
Mas... nem me importa esse mundo
Nem as bellezas que encerra!
E' dôr não vêr ceus e terra
Mas é dôr que Deus acalma:...
Esses ternos lindos quadros
Que eu já não vejo e que eu choro,
E' esposa! e filhos que adoro!
Esposa e vós... Filhos d'est'alma!!
Oh! quanto é negra e pesada
Esta vida que me déste!
Nem raio d'essa luz celeste
Que à terra envias, Senhor!
E já vi! ― já vi a terra
Já vi o mar e os ceus, D
Vi as estrellas! meu Deus!
Oh! desgraça, pranto e dôr!
João de Deus.
Os gregos — nação verdadeiro proto-typo de illustração antiga — tinham uma quasi adoração pelos homens inspirados, cujo saber protentosamente grandioso, é como a descarga electrica que opera e produz ao simples contacto. De Demosthenes se citam grandes exemplos de orações repentinas, ou brevemente inspiradas.
Entre outras, temos as sublimes «Philippicas,» de que Cicero bebeu o genero para as suas catilinarias, e a munumentosa — pro corona. — Socrates era tambem excessivamente feliz n'este genero: sirva-nos de exemplo o seu ultimo discurso, recitado aos athenienses, cujas verdadeiras preciosidades de dicção, não existiriam hoje, se Platon não vivesse para apontal-as.
De Querno, author d'um immenso poêma: — «Alexiada» — cuja epopea apparece soterrado sob um montão de nada menos de vinte mil versos (!!!) grande numero dos quaes como o recitador acerbus — de Horacio, costumava recitar de cór, se conta um caso extraordinariamente lisongeiro para este genero de talento, que é sem duvida o mais apreciavel.
Como grande parte dos poetas repentistas, Querno era excellente gracejador, por cuja particularidade mereceu — conta-se — o ingresso á mesa do Papa Leão X, em cujo logar houve certo fidalgo, que lhe chamou — Archi-poeta — pelas continuadas citações que fazia. Querno sem quasi fitar o seu visinho, não mediou um segundo a responder:
«Archi-poeta facit versus pro mille portis» — ao que o Papa, respondeu não menos profundo repentista, accrescentou:
«Et pro milli alliis archi poeta-bibit» retrocando-lhe Querno:
«Porrige quod faciat mihi carmina docta, falernum» concluindo o papa:
«Hoc vinum enervat, dibilitaque pedes.»
Verdadeiros arcabuzes de latim e poesia!
A crêrmos Homero, Eneas foi grande repentista.
J. Caldas.
Oh! vem filha do céu, em nossas almas
Espargir dôce paz, as sanctas crenças,