Página:A Esperanca vol. 1 (1865).pdf/51

Wikisource, a biblioteca livre

mente a ella, com a innocente expansão de corações reconhecidos, e virgem de hypocrisia, nasce o ciume na mãe e com elle novos motivos de querellar seu marido.

Chega a edade em que aquellas debeis creaturinhas, carecem d'um mentor que lhes desenvolva a rasão esclarecendo-lhes o intendimento, e d'uma directora affectuosa, e instruida, que lhes allumie a alma com os primeiros clarões da fé; essa alma que prescute já em si, e começa de balbuciar indistinctamente, a vaga aspiração do infinito; e os dois esposos dizem seccamente. ― E' necessario mandar educar estas crianças.

Que sarcasmo pungente n'estas palavras!! Que parodia ridicula dos deveres de familia!!!

Lá vão os innocentes para o collegio, abandonados dos seus, entregues a estranhos que só curam de seus interesses, e pouco lhes importa que a familia prospere o se anniquille.

Uma visita por anno em tempo de ferias, apaga as saudades dos parentes, que se deliciam contando os progressos do menino, e fazendo a ennumeração das prendas da menina: umas que ella já sabe, outras que tem ainda de aprender.

Educação ephemera, superficial e balofa, sem bases de solida duração!

Camada de verniz que na sociedade brilha, e na familia de prompto se apaga! Que perdição!!!

Oh! Dai á mulher outro logar no mundo, outra missão na terra, além da de agradar-vos, satisfazendo vosso orgulho por instantes!

Não a eduqueis sómente para a sociedade, educai-a antes para a familia; deixai-a tomar o vôo que seu espirito naturalmente procura, se quereis esposas, se quereis mães!!

Não a modeleis em vossa phantazia, pelo typo das rainhas das salas; se seus triumphos satisfazem momentaneamente vossa vaidade, mais tarde achareis que elles vos são nocivos, quando carecêreis da força para dominar seu imperio.

Se quereis regenerar a sociedade, substituir a corrupção pela virtude, educai a mulher, só ella o poderá conseguir.

Que quadro ha ahi mais tocante, mais terno e sublime, que o da mãe, com seu filho nos braços, estreitado ao seio, apontando-lhe o firmamento, como para lhe ensinar a soletrar n'esse livro de prodigios, os mysterios de Deus?! O sorriso da criança, não compensará a mulher?

Esse gesto de encantadora meiguice, com que o filho, mal podendo balbuciar ainda, ergue instinctivamente para o céo, suas mãosinhas supplicantes, não encherá de alegria e lagrimas, o coração da extremosa mãe?!

Depois, sobre o berço, essas horas de inquieta vigilia que passa, guardando o somno do innocente, quanto lhe são bem pagas, com os beijos que sofrega lhe devora!!

Mais tarde, quando chega o esposo, como estremece de intimo jubilo, vendo-o comtemplar silencioso e terno, o berço onde o filho repousa adormecido!!

Henriqueta Elyza

(Continua.)

 
 
O amor recompensado

N'esta contemplação, em que Henrique e Maria pareciam pedir á natureza um cantico de poesia vaga e sublime, que lhes traduzisse em linguagem aquelle poema d'amor que lhes ia n'alma, uma serie de recordações saudosas d'um passado de innocencia, de alegria e de risonhos diverimentos, se veio apresentar como assumpto á mente d'ambos. Relembraram-se dias de primavera, quando ao alvorecer corriam juntos pelos campos a colher as flores mais bonitas, orvalhadas ainda e exhalando os dulcissimos perfumes matinaes, para com ellas se tecerem