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A cidade e as serras
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a tenaz incessancia do trabalho latente, a devorante canceira do lucro, arquejante por traz das frontarias decorosas e mudas. Então, emquanto fumava o meu charuto, extranhamente se apossaram de mim os sentimentos que Jacintho outr’ora experimentára no meio da Natureza, e que tanto me divertiam. Ali, á porta do café, entre a indifferença e a pressa da Cidade, tambem eu senti, como elle no campo, a vaga tristeza da minha fragilidade e da minha solidão. Bem certamente estava ali como perdido n’um mundo, que me não era fraternal. Quem me conhecia? Quem se interessaria por Zé Fernandes? Se eu sentisse fome, e o confessasse, ninguem me daria metade do seu pão. Por mais afflictamente que a minha face revelasse uma angustia, ninguem na sua pressa pararia para me consolar. De que me serviriam tambem as excellencias d’alma, que só na alma florescem? Se eu fosse um santo, aquella turba não se importaria com a minha santidade; e se eu abrisse os braços e gritasse, ali no Boulevard — «ó homens, meus irmãos!» os homens, mais ferozes que o lôbo ante o Pobresinho d’Assis, ririam e passariam indifferentes. Dous impulsos unicos, correspondendo a duas funcções unicas, parecia estarem vivos n’aquella multidão, — o lucro e o gôso. Isolada entre elles, e ao contagio