Jacinto encolheu desinteressadamente os ombros:
— Sim... Eu não tenho nunca apetite, já há tempos... Já há anos.
Do outro prato só compreendi que continha frangos e túbaras. Depois saboreariam aqueles senhores um filete de veado, macerado em Xerês, com geleia de noz. E por sobremesa simplesmente laranjas geladas com éter.
— Em éter, Jacinto ?
O meu amigo hesitou, esboçou com os dedos a ondulação dum aroma que se evola.
— É novo... Parece que o éter desenvolve, faz aflorar a alma das frutas...
Curvei a cabeça ignara, murmurei nas minhas profundidades:
— Eis a Civilização !
E descendo os Campos Elísios, encolhido no paletó, a cogitar neste prato simbólico, considerava a rudeza e atolado atraso da minha Guiães, onde desde séculos a alma das laranjas permanece ignorada e desaproveitada dentro dos gomos sumarentos, por todos aqueles pomares que ensombram e perfumam o vale, da Roqueirinha a Sandofim! Agora porém, bendito Deus, na convi- vência de um tão grande iniciado como Jacinto, eu compreenderia todas as finuras e todos os poderes da Civilização.
E, (melhor ainda para a minha ternura!) contemplaria a raridade dum homem que, concebendo uma ideia da Vida, a realiza — e através dela e por ela recolhe a felicidade perfeita.
Bem se afirmara este Jacinto, na verdade, como Príncipe da Grã-Ventura!