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Página:A cidade e as serras (1912).djvu/70

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A CIDADE E AS SERRAS

senhores, com efeito, celebravam o seu Romance, a Couraça, lançado nessa semana entre gritinhos de gozo e um quente rumor de saias alvoroçadas. Um sobretudo, com uma vasta cabeça arranjada à Van-Dyck e que parecia postiça, proclamava, alçado na ponta das botas, que nunca penetrara tão fundamente, na velha alma humana, a ponta da Psicologia Experimental! Todos concordavam, se apertavam contra o Psicólogo, o tratavam por «mestre». Eu mesmo, que nem sequer entrevira a capa amarela da Couraça, mas para quem ele voltava os olhos pedinchões e famintos de mais mel, murmurei com um leve assobio : — «uma delícia!»

E o Psicólogo, reluzindo, com o lábio húmido, entalado num alto colarinho onde se enroscava uma gravata à 1830, confessava modestamente que dissecara todas aquelas almas da Couraça com «algum cuidado», sobre documentos, sobre pedaços de vida ainda quentes, ainda a sangrar... E foi então que Marizac, o duque de Marizac, notou, com um sorriso mais afiado que um lampejo de navalha, e sem tirar as mãos dos bolsos:

— No entanto, meu caro, nesse livro tão profundamente estudado há um erro bem estranho, bem curioso!...

O Psicólogo, vivamente, atirara a cabeça para trás:

— Um erro?

Oh, sim, um erro! E bem inesperado num mestre tão experiente!... Era atribuir à esplêndida amorosa da Couraça, uma duquesa, e do gosto mais puro, — um colete de cetim preto! Esse colete, assim preto, de cetim, aparecia na

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