sempre admirada e toda perfeita Vênus de Milo, pensei que, se debaixo da sua testa de Deusa, pudessem tumultuar os cuidados humanos; se os seus olhos soberanos e mudos se soubessem toldar de lágrimas; se os seus lábios, só talhados para o mel e para os beijos, consentissem em tremer no murmúrio de uma prece submissa; se, sob esses seios, que foram o apetite sublime dos Deuses e dos Heróis, um dia palpitasse o Amor e com ele a Bondade; se o seu mármore sofresse, e pelo sofrimento se espiritualizasse, juntando ao esplendor da Harmonia a graça da Fragilidade; se ela fosse do nosso tempo e sentisse os nossos males, e permanecendo Deusa do Prazer se tornasse Senhora da Dor—então não estaria colocada num museu, mas consagrada num santuário, porque os homens, ao reconhecer nela a aliança sempre almejada e ,sempre frustrada do Real e do Ideal, decerto a teriam aclamado in aeternum, como a definitiva Divindade. Mas quê! A pobre Vênus só oferecia a serena magnificência da carne. De todo lhe faltava a chama que arde na alma e a consome. E a criatura incomparável do meu cismar, a Vênus Espiritual, Citereia e Dolorosa, não existia, nunca existiria!... E quando eu assim pensava, eis que tu surges, e eu te compreendo! Eras a encarnação do meu sonho, ou antes dum sonho que deve ser universal—mas só eu te descobri, ou, tão feliz fui, que só por mim quiseste ser descoberta!
Vê, pois, se jamais te deixarei escapar dos meus