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Página:A illustre Casa de Ramires (1900).djvu/32

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A ILUSTRE CASA DE RAMIRES

abastecido, com uma farta rêsma de tiras d’almaço sobre a banca, começou a repassar o Poemeto do tio Duarte, inclinado ainda a transpôr para a aspereza d’uma manhã de Dezembro, como mais congenere com a rudeza feudal dos seus avós, aquella lusida cavalgada de donas, monges e homens d’armas que o tio Duarte estendera, atravez d’uma suave melancolia outomnal, pelas veigas do Mondêgo...

Na pallidez da tarde, entre a folhagem
Que o outomno amarellece...

Mas, como era então Junho e a lua crescia, Gonçalo determinou por fim aproveitar as sensações de calor, luar e arvoredos, que lhe fornecia a aldeia — para levantar, logo á entrada da sua Novella, o negro e immenso Paço de Santa Ireneia, no silencio d’uma noite d’Agosto, sob o resplendor da lua cheia.

E já enchera desembaraçadamente, ajudado pelo Bardo, duas tiras, quando uma desavença com o seu caseiro, o Manoel Relho, que amanhava a quinta por oitocentos mil reis de renda, veio perturbar, na fresca e noviça inspiração do seu trabalho, o Fidalgo da Torre. Desde o Natal o Relho, que durante annos de compostura e ordem se emborrachava sempre aos domingos com alegria e com pachorra, começára a tomar, tres e quatro vezes por semana, bebedeiras