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A ILUSTRE CASA DE RAMIRES
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rodeada de escanhos até ao topo, onde se erguia, deante d’um aspero mantel de linho coberto de pratos de estanho e de picheis luzidios, a cadeira senhorial com o Açor grossamente lavrado nas altas espaldas, e d’ellas suspensa, pelo cinturão tauxeado de prata, a espada de Tructesindo. Por traz negrejava a funda lareira apagada, toda entulhada de ramos de pinheiro, com a prateleira guarnecida de conchas, entre bocaes de sanguesugas, sob dois molhos de palmas trazidas da Palestina por Gutierres Ramires, o d’Ultramar. Rente a um esteio da chaminé, um falcão, ainda emplumado, dormitava na sua alcondora: e ao lado, sobre as lages, n’uma camada de juncos, dois alões enormes dormiam tambem, com o focinho nas patas, as orelhas rojando. Toros de castanheiro sustentavam a um canto um pipo de vinho. Entre duas frestas engradadas de ferro, um monge, com a face sumida no capuz, sentado na borda de uma arca, lia, á claridade do candil que por cima fumegava, um pergaminho desenrolado... Assim Gonçalo adornára a soturna sala Affonsina com alfaias tiradas do Tio Duarte, de Walter Scott, de narrativas do Panorama. Mas que esforço!... E mesmo, depois de collocar sobre os joelhos do monge um folio impresso em Moguncia por Ulrick Zell, desmanchára toda essa linha tão erudita, ao recordar, com um murro na mesa, que ainda a Imprensa