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Página:A morgadinha dos canaviais.djvu/21

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quadrupedes, cuja má vontade era a custo refreada.

― Entre, entre ― insistia o homem.

― Mas esses animalejos?...

― Ah! isto não faz mal. Sae-te p'ra lá, Lobo: passa, Tyranno!

Lobo! Tyranno! Que nomes! E dizia o homem que não faziam mal!

― C'os diabos! ti'Manuel ― disse o almocreve ― em occasião de se esperarem hospedes, não se soltam assim os cães. Os diabos não são nenhuns cordeiros. Olhe no outro dia o sr. Joãosinho das Perdizes, que por pouco lhes deixava nos dentes as barrigas das pernas.

― Forte perca! ― resmoneou o outro. ― Não trouxesse cá os d’elle. Não tem dúvida; entre o senhor, que elles não lhe fazem mal.

― Não entro; assim é que não entro ― teimou Henrique, a quem as palavras do almocreve acabaram de fortificar na sua resolução.

O homem em vista d’isto encolheu os hombros e bradou:

― Ó Luiz!

Uma creança de cinco annos, e quasi nua, correu ao chamamento.

― Enxota para lá esses cães, que aqui o senhor tem mêdo.

A creança, á palavra mêdo, fitou Henrique com uns olhos espantados, e tomando do chão um tronco de tojo, deu-se a zurzir desapiedadamente nas feras, que, com todos os signaes de respeito, de orelha baixa e cauda abatida, fugiram deante d’ella.

O orgulho de Henrique de Souzellas ficou um tanto maltratado com o desfecho da scena; mas a prudencia consolava-o, dizendo-lhe que andára ajuizadamente.

― Agora vossemecê ― disse o camponez para o almocreve ― arranje-se como puder e mais a bêsta ahi pelas lojas, emquanto eu ensino o caminho ao senhor.