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Página:A mortalha de Alzira (1924).djvu/128

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Um triste quarto, em que a formosa imagem da Virgem se destacava, como na outra cela do convento de S. Francisco de Paulo. Paredes nuas e velhas, teto esborcinado e sem forro.

Ângelo sentou-se no catre que havia a um canto, e começou a soluçar, com o rosto afogado nas mãos.

Chorava, e não sabia dizer por quê. Sofria e não se animava a confessar a si mesmo de onde lhe vinha aquela dor, que assim lhe arrancava tão quentes lágrimas do coração.

Mas seu desejo era poder naquele momento apertar nos braços alguém, cujo nome seus lábios não se atreviam a balbuciar, receosos de magoarem a candidez da sua alma virginal, branca noiva de Deus! O seu desejo era poder dizer o que lhe ensinara a Bíblia, era poder cantar a capitosa música do Cântico dos Cânticos, que nunca alma nenhuma jamais no mundo sonhou e repetiu sozinha. O seu desejo era poder dizer: "Eu te amo!" e sentir a miragem desta doce palavra refletida inteira nuns lábios de mulher, que lhe não falavam, porque já não tinham voz senão para soluçar de amor.

O seu desejo era Alzira!

Era Alzira de carnes brancas e olhos negros! O seu desejo eram longos cabelos nus, soltos no vendaval de todos os desejos. O seu desejo eram lábios trementes e vermelhos, eram doces braços de veludo, eram a funda morte do supremo gozo,