Página:A pata da Gazela.djvu/29

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Horacio voltou a botina.

— Mas seja embora castanha, ou mesmo loura, que é uma côr insipida de cabello! Que me importa isto? Tenho alguma cousa com seu cabello? O que amo nella é o pé; este pé sylpho, este pé anjo, que me fascina, que me arrebata, que me enlouquece?...

Horacio, que até então se contentava com olhar e apalpar a botina, inclinou-se e beijou-a no rosto; mas timida e respeitosamente. Não era essa a imagem do pé seductor, que elle adorava como um idolo?

— Mas onde encontral-o? como reconhecêl-o? exclamou dolorosamente Horacio, sentindo a realidade da situação.

Nenhum indicio que lhe revellasse o nome da mulher a quem pertencia essa gentil botina, ou lhe indicasse ao menos os traços de sua passagem. A lembrança vaga da libré de um lacaio era o unico vestigio que restava; mas com este difficilmente poderia descobrir o objecto de sua adoração. Ha tantos lacaios no Rio de Janeiro; e tantas librés que se confundem! Talvez nunca mais encontrasse aquelle que procurava; e encontrando, nem o reconhecesse.

P. da G.

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