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— Há de tê-la e bem rica, mas depois de servir de padroeira à minha escuna.

Palavras não eram ditas, que a imagem abalou do seixo onde estava e foi sem tocar o chão descendo pela encosta da montanha. De bordo viram o resplendor brilhando por entre o arvoredo, até que chegado à praia deslizou rapidamente pela flor das ondas em demanda da proa do navio.

Eis o que ainda no século passado, quando se edificou a atual ermida de Nossa Senhora da Glória, contavam os velhos devotos, coevos de Aires de Lucena. Todavia não faltavam incrédulos que metessem o caso à bulha.

A crê-los, o ermitão não passava de um mateiro beato, que se aproveitara da confusão do banquete para furtar a imagem do nicho, e levá-la ao cimo do outeiro, onde não tardaria a inventar uma romagem, para especular com a devoção da Virgem.

Quanto ao resplendor era em linguagem vulgar um archote que o espertalhão levara de bordo, e que servira a Aires de Lucena para voltar ao navio conduzindo a imagem.