inquieto como quem vai decidir de sua sorte. Às vezes apressava o passo, na sofreguidão de chegar; outras o retardava com receio do momento.
À Rua da Misericórdia encontrou-se com um ajuntamento, que o fez parar. No meio da gente via-se um homem idoso, com os cabelos já grisalhos da cabeça e da barba tão longos, que lhe desciam aos peitos e caíam sobre as espáduas.
Caminhava ele, ou antes se arrastava de joelhos, e levava em bandeja de metal um objeto, que tinha figura de mão cortada acima do punho.
Pensou Aires que era esta a cena, muito comum naqueles tempos, do cumprimento solene de uma promessa; e seguiu a procissão com olhar indiferente.
Ao aproximar-se porém o penitente, conheceu com horror que não era um ex-voto de cera, ou milagre, como o chamava o vulgo, o objeto posto em cima da salva; mas a própria mão cortada do braço direito do devoto, que às vezes levantava para o céu o coto mal cicatrizado ainda.
Inquiriu dos que o cercavam a explicação do estranho caso; e não faltou quem lha desse com particularidades que hoje fariam rir.