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LEWIS CARROLL

Moveu-se enquanto falava e ouviu lá em baixo um farfalhar de árvores. Como não tivesse fôrças para erguer as mãos até à cabeça, baixou a cabeça até às mãos e ficou encantada de ver que o pescoço dobrava em qualquer direção, como borracha de regar plantas no jardim. Ela então enrolou o pescoço e pôde mergulhar a cabeça dentro da floresta. Nem bem fêz isso e um grito agudo se fêz ouvir, seguido de furioso bater de asas. Era uma pomba que pousara em seu nariz e batia as asas com desespêro, em atitude de defesa contra o pescoço enrolado.

— Serpente! gritava a pomba.

— Não sou serpente, nada! berrou Alice furiosa. Saia do meu nariz!

— Serpente, serpente! continuava a pomba a gritar, agora em tom de chôro. Já experimentei todos os meios e não consigo livrar-me dela, ai, ai!

— Não entendo nada do que você está dizendo, gritou Alice.

— Experimentei tudo, continuou a pomba como falando para si mesma. Experimentei as raízes das árvores, as rochas escarpadas, os barrancos mais íngremes — nada, nada serve...

Cada vez mais intrigada, Alice não interrompeu a lamentação da pomba. Queria ver se das suas queixas era possível entender do que se tratava.

A pomba continuou na lamúria: “Além do trabalho de chocar os ovos, tenho de conservar-me em vigilância dia e noite. Há três semanas que não fecho os olhos, e nem aqui, nesta copa tão alta, encontrei paz...”