Página:Amor de Perdição (1862).pdf/246

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elos seus companheiros de degredo o dinheiro que lhe dava.

— É demente o senhor Simão?! — disse o desembargador.

— Tenho a demencia da dignidade: por amor da minha dignidade me perdi: quero agora vêr a que extremo de infortunio ella póde levar os seus amantes. A caridade só me não humilha, quando parte do coração e não do dever. Não conheço a pessoa, que me remetteu este dinheiro.

— É sua mãe — tornou Mosqueira.

— Não tenho mãe. Quer v. ex.^a remetter-lhe esta esmola rejeitada?

— Não, senhor.

— Então, senhor commandante, cumpra o que lhe peço, ou eu atiro com isto ao rio.

O commandante aceitou o dinheiro, e o desembargador sahiu de bordo como espantado da sinistra condição do moço.

— Onde é Monchique? — pergutou Simão a Marianna.

— É acolá, senhor Simão — respondeu, indicando-lhe o mosteiro, que se debruça sobre a margem do Douro, em Miragaya.

Cruzou os braços Simão, e viu através do gradeamento do mirante um vulto[1].

Era Thereza.

  1. Quando escrevi este livro, ainda existia o mirante. Agora, lá, ou aí por perto, está um salão de baile em que dançam nos dias santificados marujos e as damas correspondentes. - (Nota da 5ª edição).