desde já que não é preciso mandar-me à casa as tais carradas de razões; isto pode importar-lhe uma grande despesa de carretos sem necessidade.
Decidi contar-lhe confidencialmente a minha vida desta semana, para que não lhe reste a menor dúvida sobre a boa-fé com que procedi em todo este negócio, e para assim habilitá-lo a redigir uma daquelas desculpas da rotina, com que ordinariamente os jornais (compreendido o nosso por política) embaçam os leitores, logo pela manhã, e em jejum, ocasião esta em que naturalmente os carapetões são de mais fácil digestão.
Os nossos velhos da era antiga diziam que não havia domingo sem missa, sem segunda-feira sem preguiça. A primeira parte deste provérbio tem sofrido nos últimos tempos alguma modificação, principalmente a respeito dos redatores dos grandes jornais, que substituíram à missa o folhetim. Mas em compensação ninguém ainda se animou a contestar a segunda e última parte do anexim, e pó isso na segunda-feira redatores, folhetinistas, leitores e leitoras, todos desejariam poder saborear as delícias do dolce farniente.
Como isto não é possível a todos, o que se segue é que muitas vezes o corpo parece que trabalha, enquanto a mente, como uma sultana favorita, se embala molemente nas doces recordações do domingo e de toda a semana passada.
O redator estende a folha de papel para escrever o seu artigo de fundo; mas, quando procura pelo pensamento, vai descobri-lo no fundo de algum boudoir elegante, donde não há forças que o possam arrancar. Resulta daí que, depois de algumas horas de esforço baldado, o tal artigo de fundo fica no fundo do tinteiro.
A mocinha com os olhos quebrados e corpinho lânguido toma o seu bordado e começa a trabalhar. Pensa que está fazendo ponto de crochê! Qual! está fazendo namoro a crochê. Os olhos e a boquinha são os ganchos; cada ponto é um olhar provocador; cada malha um jogo vivo de sorrisos à direita e à esquerda. Quando a agulha fere-lhe um dos