Página:As Minas de Prata (Volume I).djvu/15

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Apenas a primeira badalada do sino repercutiu nos ares e a larga portada da Sé abriu de par em par, o grupo de velhas beatas, que tinham amanhecido no adro da igreja, envoltas em longas mantilhas de rebuço, esgueirou-se pela teia das naves e lá foi tomar lugar no cruzeiro.

Em pouco as lájeas do vasto pavimento se iam cobrindo daquelas trouxas negras ou pardas de seda e burel, que nem longes tinham de vulto humano; da massa enorme elevou-se um sussurro, a princípio imperceptível, e foi crescendo, como se um enxame de vespas esvoaçasse pelo âmbito da igreja.

Nesse momento invadiu o altar uma corporação, que hoje tem perdido muito da sua primitiva importância social, mas que no século XVII representava um papel distinto em todas as carolices e galhofas da época; doze meninos do coro, metidos em sacos de lã vermelha, espalharam-se pelo corpo da igreja armados do competente acendedor.

Foi um rebuliço: os rapazes travessos, rindo como perdidos, pisavam de propósito os vestidos das velhas devotas, que se conchegavam resmoneando uma ladainha de imprecações; a mocidade imprudente não respeitava a velhice; os ânimos se exacerbavam,