Página:As Minas de Prata (Volume III).djvu/130

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Ouvindo o calmo resfolgo da respiração subtil, torna de manso para não perturbar o somno de passarinho do bom do amo seu.

Quem soubesse do tarde que recolhera o advogado e do resfriado que vinha com o chuvisqueiro da noite, não estranhara uma tal inversão nos seus habitos madrugadores. Desde que estava no Brasil, não passara o letrado de Arrayollos outra noite de tributações, como essa tão aziaga que lhe trouxera de janeiras, o anno da graça de 1609.

Si bem nos lembramos, ficou o doutor na casa mysteriosa, onde cortezmente o recebera a formosa dona. Esta depois que o saudou, lhe indicara uma cadeira de espaldar, que estava fronteira. Junto ao cochim havia sobre o velador de charão, obra da India, uma bolsa cheia de ouro, posta em salva de prata.

Desculpai-me o desarranjo que vos causei, meu senhor, e a mesquinhez da recompensa. Outra de mais valia vos guardarei eternamente no meu coração pela generosidade que houveste com uma desconhecida.

Ao proferir destas palavras com a voz tremula e um ligeiro accento castelhano, a dona tomára a salva do velador, e á pouco e pouco resvallando