Página:Aventuras de Hans Staden (6ª edição).pdf/82

Wikisource, a biblioteca livre
76
MONTEIRO LOBATO

época do seu sacrificio. Enquanto os indios conferenciavam, Hans, muito triste, olhava para a lua, a dizer consigo:

— “Oh, meu Deus, ajuda-me nesta aflição e faze que breve me veja livre deste martirio”.

Os selvagens estranharam-lhe os modos e perguntaram-lhe por que olhava tanto para a lua.

— “Noto que ela está zangada”, respondeu ele. E, de fato, a lua lhe parecia terrivel, como Deus lhe parecia terrivel, como tudo lhe parecia terrivel.

Nhae-pepô, que era um dos que mais desejavam o seu sacrificio, perguntou-lhe :

— “Com quem estã zangada a lua ?”

Hans respondeu com ares misteriosos :

— “Ela olha para tua cabana...”

Nhae-pepô enfureceu-se. Para abrandar-lhe a colera Hans remendou o dito:

— “Não será contigo; ela deve estar zangada com algum dos teus escravos carijós”.

O incidente parou aí, mas teve consequencias inesperadas, como veremos depois.

No dia seguinte chegou a noticia de que os atacantes da vespera, ao sairem dali, dirigiram-se a Mambucaba, cuja aldeia assaltaram e incendiaram. Os moradores puderam fugir, com exceção de uma criança que foi capturada. '

— Coitadinha ! exclamou a menina, compadecida. E foi comida ?...

— Não sei, respondeu dona Benta; Hans Staden nada conta do destino dessa infeliz, mas a mim me parece que a não mataram. Os indios poupavam as crianças.