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MONTEIRO LOBATO

mandou vir à sua presença. Deu-lhe de comer e contou-lhe que outrora capturara um português, do qual comera tanto que desde então vinhã sentindo um mal do estomago.

Hans disse logo :

— “Pois é isso. A carne humana é um veneno terrivel e a tua doença vem de a teres comido. Se de hoje em diante desistires de comê-la, sararás e nunca mais terás sonhos tristes”.

Karimã deu-se por convencido e prometeu nunca mais comer gente.

Começaram os indios a ter medo de Hans e a respeitá-lo. Até as velhas da taba, que eram voracissimas e costumavam maltratá-lo com beliscões e ameaças, ganharam medo ao alemão, cujo deus se patenteava de maneira assim visivel.

Uma delas veio dizer-lhe :

— “Meu filho, não nos deixes morrer. Se te tratamos mal é que te julgavamos português, gente a quem odiamos. Já comemos varios deles, mas o deus português não fazia caso. O teu deus zanga-se e porisso vemos que de fato não és português”.

Desde essa ocasião todos da taba o deixaram em paz, embora o mantivessem sob vigilancia, como dantes.

— O tal português que Karimã-Kui comeu devia ser um pero de 24 quilates, para encruar assim o estomago de um canibal, comentou Pedrinho.

— Não caçõe dos seus avós, menino, advertiu dona Benta a sorrir e continuou.