Página:Capitulos de historia colonial (1934).djvu/182

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contavam-se entre os maiores beneméritos da coroa portuguesa.

Tal transfiguração não se deram pressa em reconhecer os filhos do além-mar. Daí atritos freqüentes. Gregório de Matos, baiano que se formara em Coimbra e aliás não revela simpatia particular pelos patrícios, já na segunda metade do século XVII manejava o látego da sátira contra o reinol: vem degradado por crimes ou fugido ao pai, ou por não ter o que comer, salta no cais descalço, despido, roto, trazendo por cabedal único piolhos e assobios, curte a vida de misérias, amiúda roubos, ajunta dinheiro, casa rico e ocupa os cargos da república! De outra parte não faltariam respostas mordazes e remoques equivalentes.

Destes atritos e malquerenças a primeira manifestação pública explodiu nas terras do ouro com a chamada guerra dos Emboabas, uma das designações dos reinóis na língua geral. Para o caso de que vamos agora tratar a designação era pouco rigorosa. Naquelas brenhas tão alongadas do litoral devia haver poucos portugueses; é provável, quase certo, estivessem em minoria nos combates: mas a alcunha, além de afrontosa, resolvia uma questão difícil: como chamar os adversários, em sua maioria gente da ribeira do São Francisco, se muitos vieram de São Paulo ou procediam de paulistas, e eram baianos os de uma, pernambucanos os de outra margem? Chamavam emboabas a todos os que não sairam de sua região, explica Rocha Pita.

Os paulistas afetavam profundo desprezo pelo emboaba, tratavam-no por vós, como se fora escravo, informa o cronista destes sucessos. Durante o prazo de sua prepotência entre a serra da Mantiqueira e a do Espinhaço, nas primeiras décadas da anarquia incompreensível, entregaram-se aos maiores excessos e só a força deu leis. Um dia, ante a violência praticada à sua vista contra um pobre diabo, protestou Manuel Nunes Viana, emboaba poderoso, afazendado nas margens do Carinhanha, prático em guerras contra o gentio do S. Francisco, nas quais