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XII

Lança-se ao fundo o ignívomo instrumento,
Todo o peso se alija; o passageiro,
Para nadar no túmido elemento,
A tábua abraça que encontrou primeiro;
Quem se arroja no mar temendo o vento,
Qual se fia a um batel, quem a um madeiro,
Até que sobre a penha, que a embaraça,
A quilha bate e a nau de despedaça.

XIII

Sete somente do batel perdido
Vem à praia cruel, lutando a nado;
Oferece-lhes socorro fementido
Bárbara multidão, que acode ao brado;
E, ao ver na praia o benfeitor fingido,
Rende-lhe as mãos o náufrago enganado.
Tristes! que a ver algum qual fim o espera
Com quanta sede a morte não bebera!

XIV

Já estava em terra o infausto naufragante,
Rodeado da turba americana;
Vem-se com pasmo ao porem-se diante,
E uns aos outros não crêem da espécie humana;
Os cabelos, a cor, barba e semblante
Faziam crer aquela gente insana
Que alguma espécie de animal seria,
Desses que no seu seio o mar trazia.