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CARTAS DE INGLATERRA

estamos longe de vêr desencadear um odio nacional, uma perseguição social contra os judeus; mas ha sufficientes symptomas de que o desenvolvimento firme d’este Estado israelita dentro do Estado christão começa a impacientar o inglez. Não vejo, por exemplo, que o que se está passando na Allemanha, apesar de exhalar um odioso cheiro d’auto-de-fé, provoque uma grande indignação da imprensa liberal de Londres: e já mesmo um jornal da auctoridade do Spectator se vê forçado a attenuar, perante os graves protestos da colonia israelita, artigos em que descrevera os judeus como uma corporação isolada e egoista, á semelhança das communidades catholicas, trabalhando só no mesmo interesse, encerrando-se na força da sua tradição e conservando sympathias e tendencias manifestamente hostis ás do estado que os tolera. Tudo isto é já desagradavel.

Mas que diremos do movimento na Allemanha? Que em 1880, na sabia e tolerante Allemanha, depois de Hegel, de Kant e de Schopenhauer, com os professores Strauss e Hartmann, vivos e trabalhando, se recomece uma campanha contra o judeu, o matador de Jesus, como se o imperador Maximiliano estivesse ainda, do seu acampamento de Padua, decretando a destruição da lei Rabbinica e ainda prégasse em Colonia o furioso Grão-de-Pimenta, geral dos dominicanos — é facto para ficar de bocca aberta